ENTREVISTA A MARIA AMÉLIA FIGUEIREDO | “Caneças tem uma riqueza única no concelho”

A Fonte de Castelo de Vide em Caneças está desativada e degradada. Maria Amélia Figueiredo carrega consigo a mágoa de não poder mostrar aos netos o projeto criado pelo seu avô, em 1931. A história de Caneças confunde-se com a história das fontes e principalmente das nascentes haveriam de levar a água a Lisboa através do Aqueduto das Águas Livres, no século dezoito.

E a história de uma dessas cinco fontes marcou a vida da família de Maria Amélia Figueiredo. Aos 80, a canecense de corpo e alma recorda o avô, Aniceto Paisana, que em 1931 construiu uma fonte privada: a Fonte de Castelo de Vide.

A água da Fonte de Castelo de Vide foi avaliada em 1842 mas só se procedeu à construção do espaço nesse ano. Em 1932, inicia-se o processo de exploração da água, atividade que se prolongou até 1977.A proprietária resume a história: “o fornecimento de água para Lisboa era feito através da Fonte das Fontainhas, que era pública. Depois da 2ª Guerra Mundial, houve muita gente interessada em tornar-se aguadeiro e fazer da sua vida a venda de água em Lisboa. As águas de Caneças estavam à beira de Lisboa e eram muito cobiçadas. Contudo, o abastecimento da Fonte das Fontainhas não chegava porque tinha apenas uma bica. Foi nessa altura que proprietários decidiram, por conta própria, construir as suas fontes privadas: Passarinhos, Piçarras, Castanheiros e a de Castelo de Vide, do meu avô”.

Segundo Maria Amélia Figueiredo, “esta foi a única fonte que teve sempre alvará para vender em barro e em vidro”.

A antiga presidente da Junta de Freguesia de Caneças explica que, enquanto “as outras fontes iam morrendo, a Fonte de Castelo de Vide ainda trabalhava depois do 25 de abril de 1974”.

Recorda que o restaurante do qual o pai, António Paisana, era proprietário ainda servia água da fonte. E revela também que esta foi “a última fonte a vender em barro”.

A Fonte de Castelo de Vide acaba por ser desativada porque “o projeto de obra de reconstrução do espaço e de enchimento”, idealizado por António Paisana no início dos anos 80, não avançou”.


VOZ ATIVA

É junto ao que resta dessa fonte que Maria Amélia Figueiredo continua a viver, desagradada com o que está a acontecer com as fontes de Caneças: “foram classificadas de interesse municipal, mas não as restauraram. Não souberam preservá-las e fazer, de facto, a história desta terra da água”.E acrescenta: “agora, a autarquia comprou uma já destruída, que já tinha sido vendida e revendida, a Fonte das Piçarras, para servir de Centro Interpretativo das Águas de Caneças”.

“Mas que melhor centro interpretativo haveria que as próprias fontes, se preservadas, obrigadas para abrir as portas para ser mostradas?”, questiona. “É inadmissível”.

Maria Amélia Figueiredo dá um exemplo: “a Câmara Municipal de Odivelas poderia ter reconstruido o telhado desta fonte de Castelo de Vide”. A munícipe diz ainda que, “apesar de escrever para a autarquia”, não obtém respostas.

Para a canecense, “a história da vida das pessoas é tão importante como as pedras da calçada”. Sobre a Fonte de Castelo de Vide “guarda tudo, desde as primeiras análises” e uma das suas maiores infelicidades é não poder deixar aos netos a propriedade como eu conheceu.

Voz ativa na vila, Maria Amélia Figueiredo foi, para além de autarca, presidente da Sociedade Musical e Desportiva de Caneças, a primeira mulher a ocupar o cargo.

Defende que a freguesia de Caneças é específica e que deveria estar separada da Ramada. “Como é que uma freguesia com mas de 100 anos se juntou a uma freguesia jovem, com características completamente dispersas?”, interroga.

“A história de Caneças é única. É a história das águas, das lavadeiras, dos viveiros. A vila tinha muitos pinheiros e poucos eucaliptos, e uma abundância de água excecional. Todas essas condições davam beleza. Tem uma riqueza única no concelho”, afirma.“Todas essas coisas deviam merecer do concelho de Odivelas um atenção e apoio de excelência”, reforça.

Dá como exemplo o trabalho da Associação dos Amigos de Caneças, que tem já imenso património, disperso por garagens e casas de amigos. “Era preciso haver um espaço, um museu”, conclui.

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