FESTA DA LIBERDADE CELEBRADA EM CONFINAMENTO

Foi ao som de “A Portuguesa” que foi aberta a sessão solene de comemoração do 25 de Abril na Assembleia da República. Mas, para os portugueses, este ano, a festa da liberdade faz-se em casa e de janelas abertas para ouvir cantar «A Grândola»

 Pela primeira vez, em 46 anos, o 25 de Abril não se viveu nas ruas. Sem desfiles nem convívio, a festa da liberdade foi feita entre paredes. Mas, mesmo assim, em quarentena o dia não perdeu importância, com foi realçado na Assembleia da República pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pelo presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, e pelo Primeiro-Ministro, António Costa.

Num cenário de pandemia e de estado de emergência, os 46 anos da Revolução de 25 de Abril foram celebrados na Assembleia da República, numa sessão solene adaptada às restrições exigidas. Com um total de 88 pessoas, entre elas o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, foram ouvidos 11 discursos. Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que «o 25 de Abril é essencial e tinha de ser evocado. Não o invocar seria um absurdo cívico e um péssimo sinal».

Num discurso focado na importância do 25 de Abril e na celebração da liberdade, o Presidente da República salientou: «É precisamente em tempos excecionais que se impõe evocar o que constitui mais do que um costume ou um ritual, o que é manifestamente essencial».

«O 25 de Abril é essencial e tinha de ser evocado», afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, explicando que «em tempos excecionais de dor, de sofrimento, de luto, separação, de confinamento, importa evocar a pátria, a independência, a república, a liberdade e a democracia».

Respondendo às discussões geradas pela celebração deste dia tendo em conta o cenário atual, o mais alto magistrado da Nação defendeu que «a presente evocação não é uma festa de políticos alheia ao clima de privação vivido na sociedade portuguesa. Evocar o 25 de Abril é falar deste tempo, não é ignorá-lo. Invocar o 25 de Abril é combater a crise na saúde e a crise social. Invocar o 25 de Abril é chorar os mortos».

Para o chefe de Estado é também importante assegurar que outras datas marcantes para Portugal, como o 10 de Junho, 5 de outubro e 1 de dezembro, também serão assinaladas.


Um bom exemplo…

«Esta sessão é um bom exemplo. O que seria incompreensível e civicamente vergonhoso era haver todo um país a viver este tempo de sacrifício e de entrega e a Assembleia da República demitir-se de exercer todos os seus poderes numa situação em que eles eram e são, mais do que nunca, imprescindíveis», defendeu Marcelo Rebelo de Sousa que, após terminar a sessão na AR, se deslocou ao Cais do Sodré e a Santa Apolónia acompanhado pelo ministro da Defesa, para distribuir refeições, confeccionadas pela Câmara de Lisboa e Santa Casa da Misericórdia, a pessoas sem-abrigo.

Do ponto de vista do Presidente, «deixar de evocar o 25 de Abril no tempo em que ele porventura mais está a ser posto à prova nos últimos 46 anos, seria um absurdo cívico», salientando que seria também «um péssimo sinal de falta de unidade no essencial e de compromisso de juntos, na nossa diferença, continuarmos uma missão que não está acabada».

O chefe de Estado admitiu que este é um tempo de sacrifício para todos os portugueses e pediu «convergência e unidade no país», admitindo que o caminho a fazer “ainda é longo, difícil e imprevisível”.

Minuto de silêncio em memória das vítimas

A cerimónia na Assembleia da República iniciou-se com um minuto de silêncio, a pedido do presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, em memória dos portugueses que morreram devido à Covid-19.

«Portugal e os portugueses têm sido confrontados, nas últimas semanas, com as consequências de uma grave pandemia internacional, cuja evolução tem acarretado sérias implicações ao nível social, económico e financeiro. A perda de centenas de vidas humanas é, sem dúvida, a expressão mais violenta da pandemia, porque irreversível», afirmou Ferro Rodrigues, acrescentando que «bastaria que se perdesse apenas uma vida, para que o lamento se fizesse ouvir e a solidariedade chegasse a quem vê desaparecer um seu ente querido».

«Nesta hora difícil que vivemos, os nossos pensamentos estão com todos quantos perderam familiares e amigos. Com todos quantos se encontram hospitalizados, lutando, pela sua sobrevivência, contra este vírus terrível. Com todos quantos estão impossibilitados de contactar os seus mais próximos, confinados nas suas residências ou em instituições um pouco por todo o País, tentamos atenuar o vazio da privação dos afetos de proximidade», fez questão de salientar o presidente da Assembleia da República.

Apesar do estado de emergência, o presidente da Assembleia da República sublinhou que a democracia não ficou suspensa: «Mas mesmo em estado de emergência, em liberdade. Mesmo em estado de emergência, não vimos ser suspensa a democracia que somos, a democracia que Abril nos trouxe nessa manhã inesquecível, que com sentido de dever e responsabilidade evocamos e celebramos volvidos 46 anos.»

Ferro Rodrigues, indo ao encontro do discurso de Marcelo, insistiu que «a Assembleia da República, com os seus deputados, não saiu do palco democrático tal como o fez nas últimas semanas respeitando todas as recomendações ao nível da saúde e da segurança, dando o exemplo pela prevenção e pelo trabalho, abriu hoje mais uma vez as suas portas ao país. E se não fechou as portas no passado, não faria sentido que não as abrisse hoje, 25 de Abril de 2020, 46 anos depois de Abril que nos deu a liberdade”.

«Desde 3 de junho de 1976, a Assembleia da República está em pleno funcionamento. Hoje não foi exceção, hoje não é exceção. A liberdade não está só a passar por aqui, a liberdade é aqui e agora», sublinhou o presidente da Assembleia.

«Ontem como hoje, honrando o papel fundamental do Parlamento, honrando quem representamos, honrando este chão comum que é a Constituição da República Portuguesa saída de 1976, honrando a Democracia que somos e todos quantos a tornaram possível», declarou Ferro Rodrigues.

O presidente da AR deixou ainda um elogio a todos os portugueses que «contra todas as expectativas, contra muitos que pensavam nunca tal poder acontecer, os portugueses foram capazes de ultrapassar bloqueios e encontrar soluções capazes de recuperar o país da profunda crise – até mesmo de identidade e de valores – em que se encontrava, depois de um período tão difícil e complexo como foi o período de assistência financeira, com profundos impactos na pobreza e na exclusão social».

«De uma coisa estou certo: Portugal e os portugueses estão vacinados contra a austeridade. Resta saber se a vacina tem 100 por cento de eficácia», esclareceu.

«Num momento em que os portugueses esperam dos seus representantes sentido de responsabilidade, estou certo de que todos os representantes políticos – porque todos contam, porque todos são importantes – darão o seu contributo para um novo presente, para um futuro melhor», acrescentou.

Quer comentar a notícia que leu?