38ª EDIÇÃO DOS PRÉMIOS GAZETA PREMIOU A EXCELÊNCIA NO JORNALISMO

edifício dos Paços do Concelho, em Lisboa, recebeu, esta sexta-feira, 5 de janeiro, a 38ª edição dos prémios Gazeta, que todos os anos premiam o que de melhor se fez no jornalismo português. Foram distinguidos nove jornalistas, que apresentaram trabalhos em diversos meios de comunicação nacionais. A cerimónia ficou marcada pelos discursos de solidariedade e de reflexão à situação precária que se vive atualmente na comunicação social.

A 38ª edição dos Prémios Gazeta, que distinguem anualmente os jornalistas que se destacaram pela qualidade do seu trabalho, aconteceu esta sexta-feira, 5 de janeiro, no Salão Nobre dos Paços do Concelho, em Lisboa. Este galardão é uma iniciativa do Clube de Jornalistas e conta com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa. De acordo com a presidente do Clube de Jornalistas, Maria Flor Pedroso, estes são “os prémios mais antigos” no panorama da comunicação social nacional”. Ao mesmo tempo, “já conta com o apoio da autarquia lisboeta “desde os tempos do presidente Abecassis [autarca nos anos 80]”.

Lembrando que em 2024 celebram-se os 50 anos do 25 de Abril, que trouxe a liberdade de expressão, Maria Flor Pedroso, também ela jornalista, referiu-se à atual crise na comunicação social, em particular à situação delicada na Global Media Group. Este grupo detém títulos históricos como o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias ou a Rádio TSF. Por isso, e na sua opinião, “não nos podemos dar ao luxo de os perder”. 

Premiados alertaram para crise na comunicação social

Os prémios Gazeta premiaram alguns dos melhores trabalhos jornalísticos publicados em 2022, em diferentes plataformas. Miguel Carvalho, da revista Visão, foi um dos galardoados, graças à reportagem ‘O Braço Armado do Chega’. No seu discurso, o repórter lembrou os profissionais da Global Media Group, pelo seu “exemplo de coragem”. “Os jornalistas não se rendem”, sublinhou Miguel Carvalho. Por fim, e na sua visão, o capitalismo não se pode sobrepor ao jornalismo, que é “um bem essencial”.

Outro premiado desta cerimónia, também na categoria Imprensa, foi ainda o jornalista Pedro Caldeira Rodrigues, da Agência Lusa, graças à cobertura noticiosa na guerra da Ucrânia. O repórter, com 35 anos de carreira, lembrou que “fazer jornalismo não é fácil. Temos as nossas convicções e temos que enfrentar os inimigos do jornalismo de qualidade”. Pedro Caldeira Rodrigues considera ainda que o jornalismo deve ter uma função didática. De igual modo, deve manter a sua independência perante os interesses económicos e políticos.

Informação é essencial para uma sociedade informada

“Uma cidadania critica tem de ter informação”, prosseguiu o jornalista. Por fim, Pedro Caldeira Rodrigues aproveitou ainda para lembrar que, até ao momento, já morreram 1187 repórteres em todo o mundo. Já na categoria Televisão, a vencedora do prémio Gazeta foi Amélia Moura Ramos, da SIC, com a reportagem ‘A Roupa dos Brancos Mortos’, realizada no Gana.

A jornalista – que conquistou este galardão pela terceira vez -, começou o seu discurso a agradecer o empenho e o apoio da estação onde trabalha. Aqui, aproveitou para lembrar que “muitas redações não podem ir ao fim da rua sequer”, devido aos parcos recursos económicos. “Os poucos que vão, vão atrás da agenda”, criticou a repórter. Na sua opinião, “o jornalismo deve ser feito da curiosidade e da busca de factos”.

Solidariedade com os profissionais da Global Media Group

“Infelizmente, já não somos o quatro poder”, prosseguiu a jornalista. Amélia Moura Ramos aproveitou também para deixar uma palavra de solidariedade com os profissionais da Global Media Group, que estão com salários em atraso. Por sua vez, o prémio Fotografia foi entregue a João Porfírio, fotojornalista do Observador, pelas imagens captadas nos primeiros 75 dias da guerra da Ucrânia.

“Há jornalistas sem ter o que comer. O jornalismo falido é um passo para o abismo”, começou por dizer o profissional, que passou três meses na Ucrânia. “Vi milhares de mulheres mortas que podiam ser a minha mãe. Ouvi testemunhos de muitas pessoas, vi crimes de guerra. Isso é fazer jornalismo”, prosseguiu João Porfírio, considerando que o “mais importante de fazer uma cobertura de guerra é regressar”.

Reportagem é essencial

Por sua vez, o prémio Gazeta de Rádio foi para Paula Borges, da RDP África. A jornalista é autora da peça radiofónica ‘Na Arte de Resistir – Somos Moçambique’. Paula Borges lembrou que, tal como a esmagadora maioria dos órgãos de comunicação social, “a RDP África trabalha em serviços mínimos”. “Recebo este prémio numa altura difícil”, disse a repórter, referindo-se aos colegas da Global Media Group. Na sua perspetiva, o fecho de órgãos de comunicação social é um golpe “na democracia e na pluralidade”.

Já o prémio Gazeta de Multimédia foi para Inês Rocha, da Rádio Renascença, com a peça ‘O RGPD funciona?’. Este trabalho foi apoiado por uma bolsa da Gulbenkian, salientou a jovem jornalista, que parabenizou ainda “a aposta corajosa das redações na reportagem”, mesmo em tempos difíceis. Por fim, apelou a que se torne esta profissão “sustentável o mais rapidamente possível”.

Prémio Gazeta de Mérito entregue a Ana Sousa Dias

Por outro lado, o prémio Gazeta Revelação foi para Daniel Dias, do jornal Público. Este profissional também abordou a situação delicada da comunicação social. Deste modo, manifestou a sua solidariedade “com todos os jornalistas precários e todos os jovens que veem o ruir do jornalismo”. Já o prémio Gazeta de Imprensa Regional foi para o jornal regional Mensageiro de Bragança. António Rodrigues, diretor deste órgão, foi quem recebeu o troféu. Por fim, Carlos Moedas e Marcelo Rebelo de Sousa entregaram o prémio Gazeta de Mérito a Ana Sousa Dias, atual provedora do telespectador da RTP.

“Dedico o meu prémio aos colaboradores da Global Media Group. É um ataque implacável aos jornalistas, atacando-os pela fome”, disse a jornalista. Na sua visão, esta situação “é uma ameaça à pluralidade democrática”. No entanto, Ana Sousa Dias lembrou que existem, igualmente, outras redações “a passar por momentos difíceis”, com despedimentos coletivos e outras dificuldades. “Felicito-vos pela coragem com que enfrentam estes tempos”, concluiu.

Jornalismo não pode ser substituído por máquinas, diz Carlos Moedas

Já o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, começou a sua intervenção a lembrar que viveu “numa casa marcada pelo jornalismo” e pelas dificuldades inerentes à profissão, dado que o seu pai foi jornalista num jornal local em Beja. Por isso, “sinto estes desafios e as dificuldades da profissão. Sei as dificuldades do que é hoje ser jornalista, uma profissão instável, mal paga, e que muitos acabam por abandonar”, prosseguiu o autarca.

“Estou solidário com a Global Media Group porque também senti essas dificuldades e sei a angústia que é para as famílias”, disse Moedas. No mesmo sentido, para o presidente da autarquia lisboeta, “limitar o trabalho dos jornalistas é estarmos a fragilizar a democracia”.

Contudo, a par destas dificuldades, juntam-se ainda os desafios impostos pela inteligência artificial. Para Carlos Moedas, esta “não é humana” e, por isso, nunca conseguirá fazer um trabalho de qualidade como um humano. “O que aqui vimos, nesta cerimónia, é trabalho autêntico. Nenhuma inteligência artificial o faz”, reforçou. Por fim, considera ainda que “o jornalismo livre é essencial para a democracia e para escrutinar a política”.

Presidente da República pede medidas urgentes para salvar os meios de comunicação social

De seguida, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, lembrou os “desafios” que se impõem aos jornalistas e à comunicação social, que sofrem ainda com as ameaças da inteligência artificial e da deshumanização”. Na sua opinião, o 5º Congresso dos Jornalistas, que se realiza entre os dias 18 a 21 de janeiro, deve trazer soluções para responder à crise na comunicação social. Contudo, o Chefe de Estado pediu também um “debate político, mas também parlamentares”. O objetivo é “chegar a entendimentos de regime sobre esta matéria”.

“Do que se trata é de encontrar fórmulas”, disse o Presidente da República, considerando que a situação “está muito mal”. Por isso, pede medidas urgentes para travar esta crise. Caso contrário, “a situação vai piorando e torna-se irrecuperável. Não se pode demorar mais tempo. Temos de encontrar a solução já“. “Dir-se-á que eu estou pessimista. Eu não estou pessimista, estou realista“, sublinhou o Chefe de Estado, que destacou ainda a “persistência e a força dos jornalistas”.

Por fim, e referindo-se à situação da Global Media Group, Marcelo Rebelo de Sousa espera que, dentro de um ano, estes prémios aconteçam “sem estes despedimentos, sem estes não pagamentos dos salários, sem esta indefinição em que ninguém é responsável. Para o ano, a situação tem de estar melhor”, concluiu.

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