ALVALADE: UM BAIRRO REJUVENESCIDO

Apesar de ser uma das zonas mais caras da capital a nível de habitação, em Alvalade ainda é possível encontrar o espírito de bairro, com o seu pequeno comércio e os vizinhos a cruzarem-se nos cafés.

Rejuvenescido, o bairro lisboeta de Alvalade, construído nos anos 40, está a fervilhar de novidades. Restaurantes, lojas, galerias de arte e jardins juntam moradores de há décadas, com novos vizinhos e visitantes vindos de toda a cidade

A freguesia é grande, tem 5,34 quilómetros quadrados, vai da Avenida Almirante Gago Coutinho ao Hospital de Santa Maria, mas é ao eixo entre as avenidas da Igreja, de Roma e Rio de Janeiro que podemos chamar «coração». É por aqui, pelas ruas perpendiculares e paralelas, com moradores e visitantes de todas as idades, que quase tudo se passa – o bairro de Alvalade está a mudar. Entre restaurantes, lojas, barbearias e floristas, a arte urbana e contemporânea, por exemplo, ganhou destaque.

À semelhança do que está a acontecer em vários pontos da cidade, a arte urbana vem pintando muitas das paredes. Na Avenida Rio de Janeiro, no parque de estacionamento junto ao Mercado de Alvalade Norte, onde residentes e pessoas vindas de outros bairros compram bons peixes e produtos hortícolas, estão dois murais: um em homenagem ao arquiteto Nuno Teotónio Pereira, outro dedicado a José Cardoso Pires. Do outro lado do Campo Grande, no início da Rua Dr. João Soares, junto à esquina com o Campo Grande, está a obra de 20 metros de altura, da autoria de Nuno Saraiva, que assinalou, a 18 de julho, o Dia Internacional Nelson Mandela. E, recentemente, no jardim da Biblioteca dos Coruchéus inaugurou-se um mural em homenagem ao músico João Ribas, referência do punk nacional. Nesta zona, vale também a pena visitar a Quadrum, fundada por Dulce D’Agro, em 1973, galeria que está cada vez menos sozinha na representação das artes em Alvalade.

Contudo, há algo que vários moradores referem: a sensação de insegurança à noite, até em locais centrais do bairro, como a avenida da Igreja. Mas nem esta situação faz com que gostem menos de aqui viver. Para muitos é a morada à dezenas de anos. Num bairro criado de raiz nos anos 40 do século XX, ainda mantém muita vida nas suas principais artérias.

Um bairro para todos

Para Fernando Doidinho, de 65 anos, comerciante na Rua Teixeira de Pascoais, Alvalade não tem segredos. Habitante no bairro à mais de 60 anos, junto à avenida da Igreja., este comerciante faz questão de sublinhar: “Para mim foi o melhor bairro que conheci em todo o país”.

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Este morador enumera os motivos que o levam a preferir Alvalade. Entre eles, está o facto de” ter muito comércio, hospital, clínicas, espaços verdes, escolas. Até locais para fazer manutenção”.

Na vertente comercial, que lhe diz mais respeito, sublinha o facto de Alvalade “ter belíssimas lojas e ninguém vai à baixa comprar, porque tem aqui quase tudo”.

A única falha que Fernando Doidinho encontra no bairro respeita à segurança: “Deveria haver mais segurança a partir de determinada hora da noite. Embora tenha esquadra e policiamento, mas fala alguma coisa para as pessoas terem aquela sensação de segurança”.

Crise também chegou ao bairro

Já Maria Luísa Reis, de 60 anos, reformada, e residente na Rua doutor Gama Barros, considera que as principais vantagens do bairro são “a acessibilidade, o sossego, e ter algum comércio por perto, mas isso também tem a ver com a acessibilidade”. Esta moradora refere que o período da troika também deixou marcas em Alvalade: “O bairro ficou muito mais descaracterizado, houve muitas coisas que desapareceram. Fechou muito comércio”. “Para as pessoas, com dificuldade em deslocar-se é mais difícil ir a certos locais. Por exemplo, para irem à farmácia, têm que atravessar a avenida de Roma, porque aqui não há”, sublinha Luísa Reis. E sem se deter, refere também que “o centro de saúde fica na outra ponta” do bairro.

Também para esta residente a segurança é um problema, notando “que há falta de policiamento, principalmente à noite pois isto parece um deserto. Eu tenho medo de andar na rua a partir da meia-noite”.

Dinamizar comércio

Para Mário Oliveira, de 53 anos, comerciante na Rua Conde Sabogosa, o facto de “haver muita gente é uma grande vantagem. É uma zona nobre, tem bastante comércio, é apelativo especialmente ao nível do comércio. Mesmo ao nível dos jardins não está muito aproveitado. Há um jardim aqui em baixo que até nem é mau, mas as pessoas não vão lá muito”. O bairro “tem muito movimento. Houve um período, à dois/três anos em que isto esmoreceu um pouco, mas a freguesia conseguiu chamar a população, porque investiu nos bairros”. Também atraiu novos moradores, embora alguns temporários, como é o caso dos estudantes. que alugam aqui as casas”.

Este comerciante entende que o melhor a fazer pelo bairro “é dinamizar o comércio local, mesmo os próprios comerciantes devem dinamizar”.

Venda de jornais há 60 anos

Esmeralda Gomes, de 83 anos, comerciante na Av. de Roma, é um exemplo de longevidade, pois já há 66 anos que resiste com o seu quiosque numa das vias mais nobres da cidade – a Avenida de Roma. Começou com uma pequena bancada a vender jornais e só anos mais tarde passou para o quiosque, que ainda hoje mantém. “Gosto de estar aqui no bairro, porque é aqui tenho os meus amigos”, é a principal razão que esta comerciante tem para se manter neste local.

Para além de ser “um bairro sossegado”, Lídia Justino, de 58 anos, comerciante na Rua Silva e Albuquerque, aponta “a proximidade dos transportes como uma grande vantagem”. Esta comerciante refere que “cada vez há menos comércio. As rendas são muito caras e, portanto, afasta as pessoas”. Na sua opinião, “parece que estão a querer afastar as pessoas da cidade”. E num jeito um pouco fatalista refere que “todo o comércio tem os dias contados, a não ser que pertençam a uma grande distribuição”.

Voz à junta de Freguesia de Alvalade

APOIO À TERCEIRA IDADE É PRIORITÁRIO

A recuperação dos mercados e a promoção de eventos nas artérias comerciais da freguesia têm possibilitado trazer novo fôlego ao comércio de Alvalade, afirma o presidente da Junta de Freguesia de Alvalade, José António Borges.

O autarca, que salienta o trabalho realizado pela Junta para fixar os jovens, através de várias ações sociais, culturais e urbanística, revela que a oferta cultural de Alvalade para os próximos meses será inaugurada pela sua participação na Noite Branca de Lisboa 2019, com data marcada para o dia 13 de setembro.

Olhares de Lisboa – Que medidas a junta de freguesia, em conjunto com a câmara, para atrair mais jovens a viver na freguesia?

António Borges – Muito do trabalho projetado e desenvolvido pelo atual executivo tem sido orientado de modo a fixar os jovens na Freguesia de Alvalade. A opção de revitalizar a sua demografia materializa-se em diferentes componentes da nossa ação social, cultural e urbanística.

A junta de freguesia tem alguma política de apoio aos idosos?

O atendimento às problemáticas da terceira idade é uma prioridade para este executivo. Projetos como “Os Briosos” e o “Espaço Sénior” têm prestado um serviço fundamental à dinamização dos mais idosos, baseando o seu esforço numa abordagem de construção conjunta que procura promover estilos de vida ativos e políticas de integração social.

Por outro lado, os serviços sociais da Junta de Freguesia operam continuadamente junto da comunidade idosa, respondendo a situações de isolamento, fragilidade económica, risco de pobreza e exclusão social.

Como encara a junta de freguesia o encerramento de muitas lojas do comércio tradicional? Existem medidas disponíveis para os comerciantes?

A Freguesia de Alvalade tem sido relativamente poupada a esse problema, mantendo um comércio dinâmico, vivo e sustentável. Parcerias como o programa “Lojas com História” demonstram a vontade de preservar estabelecimentos tradicionais, promovendo-os junto da restante comunidade. Além disso, a recuperação dos mercados e a promoção de eventos nas artérias comerciais da freguesia têm possibilitado trazer novo fôlego ao comércio de Alvalade.

Apesar de não ser uma área da competência da junta de freguesia, o preço das habitações tem afastado habitantes da freguesia, segundo alguns cidadãos com quem falámos. Em conjunto com a câmara, há algumas medidas ao nível da habitação, que esteja ou vá ser implementada?

Planos habitacionais partilhados, como é o caso do programa “Renda Digna”, são articulados entre a Junta de Freguesia de Alvalade e a Câmara Municipal de Lisboa com a intenção de acompanhar situações de carência, principalmente no que concerne à Lei das Rendas, e facilitar o apoio concreto a situações de risco social e económico.

Que atividades culturais e de lazer vão ocorrer na freguesia até ao final do ano?

A oferta cultural de Alvalade para os próximos meses será inaugurada pela sua participação na Noite Branca de Lisboa 2019, com data marcada para o dia 13 de setembro. As sessões de cinema no Centro Cívico Edmundo Pedro terão continuidade, promovidas em parceria com o Alvalade CineClube, e as tertúlias com escritores estão de regresso, em ciclo, à Biblioteca Manoel Chaves Caminha. No fecho do ano, acontecerá o já tradicional Mercado de Natal, evento que leva o comércio local à população da freguesia num tom festivo e natalício.

1 COMENTÁRIO

  1. Deixa-me muita saudade o Bairro de Alvalade, porque sendo eu da Figueira fui trabalhar para o LNEC, como desenhador, em 1963 até 1970, tendo vivido num bairro perto do antigo cinema Alvalade, rua Guilherme de Azevedo, gostei muito de estar aí, não faltava nada nesse bairro. Ainda agora quando vou a Lisboa gosto muito de dar uma voltinha por ai, almoçar num restaurante na av. da Igreja.

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