Começou por ser um bairro de marinheiros. Depois, acolheu nobres que ali criaram palácios. No século XIX apareceram os primeiros jornais. E, mais tarde, foi a vez dos artistas se interessarem pelo local. Hoje é o principal palco da diversão noturna e um dos cartões-de-visita da cidade de Lisboa.
Verdadeiro palco iniciático da vida boémia da cidade, o Bairro Alto foi, ao longo dos séculos, palco de vivências diversificadas, intensas e sobrepostas, que marcam indelevelmente o sítio. Do fado aos bordéis, do jornalismo à moda, à arte, à música e à restauração, é um bairro que se tem «reinventado», nunca perdendo dinamismo e vibração. E, como afirmam os dirigentes da Associação de Comerciantes do Bairro Alto, Hilário Castro (presidente) e Paulo Caciano, ainda «que outras zonas da cidade surjam, esporadicamente, como locais de eleição para a noite, o Bairro (como é conhecido) nunca perdeu o seu protagonismo e permanece, para a vida noturna, uma verdadeira referência».
Para além de sítio de copos e divertimento, ali surgiu, nos anos oitenta, a geração que havia de ensaiar tipos de cultura urbana, trazida de outras latitudes, proporcionando uma revolução de mentalidades.
Do ponto de vista de Hilário Castro, «o Bairro Alto é um sobrevivente que tem a magia de se reinventar e criar» novas alternativa, sendo «a ponte central com a cidade a ganhar novas dinâmicas».
Durante o dia é um bairro calmo e sereno, reconhece o presidente da Associação de Comerciantes, mas, após o pôr do sol, as ruas estreitas e empedradas enchem-se de gente à procura «da boémia» deste bairro que está a comemorar o seu 506º aniversário.
Contudo, para além da atmosfera festiva pelas ruas estreitas e empedradas do «bairro», a Associação de Comerciantes, que representa todo o tecido empresarial, pede mais investimento em arranjos e requalificação do espaço público.
Hilário Castro louva o papel desempenhado pelo então vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa e atual Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, na regulamentação e regularização dos horários noturnos, o que ajudou a «normalizar» as regras de conduta e comportamento tanto dos empresários como dos frequentadores do bairro.
O presidente dos comerciantes do «bairro» não entende, no entanto, «as razões que levam os supermercados a terem um horário alargado e, em alguns casos, venderam bebidas alcoólicas».
Depois de salientar que o comércio local dá emprego a um grande número de residentes da Freguesia da Misericórdia, privilegiando os naturais do bairro, Hilário Castro lembra que, no final dos anos 90, «foi apresentado um projeto do agrado de comerciantes e moradores de transformar todas as ruas do bairro Alto em zonas pedonais, preservando a história e a tradição, mas, de repente, o projeto foi metido na gaveta e nunca mais se falou nele», o que é – segundo defende – «uma pena. Pois, essa mudança iria trazer uma nova dinâmica ao bairro».
Mas, engane-se quem pensar que de dia tudo está adormecido no Bairro Alto. De facto, o Bairro Alto não é só noite, nem é só copos. Se à noite a boémia instala-se, com restaurantes gourmet, tascos típicos, bares e discotecas, de dia, o bairro lisboeta que está a soprar 506 velas mostra o comércio tradicional e turístico, reúne trabalhadores ao almoço e habitantes nos cafés, nas padarias ou a falar à janela.
Mas, infelizmente, como denuncia Hilário Castro ainda existem muitos frequentadores, do género adolescente de “litrosa” de cerveja na mão, deixando como despojos da sua passagem garrafas espalhadas pelo chão, paredes grafitadas e esquinas transformadas em urinóis, prejudicando gravemente a vida de todos, comerciantes e residentes, e afastando alguns frequentadores.