O Presidente da República anuncia dissolução da AR a 19 de março e eleições a 18 de maio

O Presidente da República anunciou, esta quinta-feira, a dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições legislativas para o dia 18 de maio. No discurso que fez ao país, após reunir o Conselho de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa pediu uma campanha eleitoral com um debate que “dê força à democracia” e “não à ditadura”.

Portugal vai novamente a eleições a 18 de maio, comunicou o Presidente da República numa declaração ao país esta quinta-feira à noite, após a reunião do Conselho de Estado que decorreu esta tarde no Palácio de Belém. Marcelo Rebelo de Sousa irá dissolver a Assembleia da República na próxima quarta-feira, dia 19 de março, e convocar legislativas antecipadas.

Esta é a terceira dissolução do Parlamento no mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. Com todos os partidos a pedir a dissolução, o Conselho de Estado também votou por unanimidade pela convocação de eleições antecipadas.

Apesar de a maioria dos partidos ter pedido para 11 de maio, o Presidente da República foi sensível a diversos argumentos, incluindo o facto de no dia 11 haver muitos peregrinos a caminho de Fátima e de se disputar o jogo de futebol entre Benfica e Sporting que poderá ser decisivo para determinar quem vence o campeonato.

Opção única

“Ao Presidente da República, o primeiro interessado na estabilidade e que tudo fez ao seu alcance para o alcançar, não restava nenhuma opção senão a dissolução da Assembleia da República”, afirma Marcelo, anunciando a convocação de eleições antecipadas.

Marcelo Rebelo de Sousa começou a sua intervenção pelo contexto internacional. “Tudo a aconselhar estabilidade, ou seja, não causar crises nem sobressaltos que atrasem o que é preciso fazer e fazer bem”, referiu.


Porque é que o governo apresentou uma moção de confiança e porque é que o PS a rejeitou, depois de inviabilizar duas moções de censura?, perguntou o Presidente. A conclusão do Governo foi que “neste choque de conflitos”, sobretudo “de juízo ético”, se tinha tornado impossível governar.

“Não se pode ao mesmo tempo confiar e desconfiar ética e moralmente de uma pessoa”, afirmou, lamentando uma terceira eleição em quatro anos que “ninguém esperava e, sobretudo, que ninguém queria”.

Crise vai ser tema de campanha

“É inevitável que o tema da crise ocupe parte desse debate, em particular nas primeiras semanas. Debate que pode e deve pesar, e pesar bem, os sinais e riscos para a democracia de situações de confrontos em que não é possível haver consenso, nem que parcial seja, porque se trata de conduzir a becos de natureza pessoal e ética, que não têm saída, que não sejam as eleições”, continuou o Presidente, apelando: “Impõe-se um debate eleitoral frontal, mas digno, que fortaleça e não enfraqueça a democracia, que dê força a quem nos vier a governar.”

O Presidente da República recordou que está em execução um Orçamento do Estado que foi viabilizado e que o país goza, nesta altura, de estabilidade económica e crédito a nível internacional.

“Condições que o Presidente da República garante para que se não pare a execução do PRR, mesmo com um governo de gestão”, sublinha. O objetivo, sustenta Marcelo Rebelo de Sousa, é “permitir uma transição, se possível, tão pacífica como a vivida em 2024, só que agora em dois anos e meio e não em cinco”.

Campanha deve discutir temas que preocupam portugueses

Marcelo Rebelo de Sousa pede uma campanha que não assente em confrontos porque, defende, seria “um desperdício imperdoável não discutir aquilo que tanto preocupa o dia a dia dos portugueses” – desde a economia à saúde, passando pela educação e pela habitação.

Apela, por isso, a um debate “sereno, digno, tolerante e respeitador da diferença”. “Que não enfraqueça a democracia e não abra ainda mais a porta a experiências que se sabe como começam e se sabe como acabam.”

Um debate que, conclui Marcelo, “dê força à democracia” e à capacidade que esta tem de superar crises. Uma valência, sublinha, “que só a democracia tem, não a ditadura”.

Pedro Nuno Santos promete Governo “transformador”

Em reação ao anúncio de Marcelo Rebelo de Sousa, Pedro Nuno Santos lembra que o PS “deu todas as condições para o Governo governar”, dando como exemplo a aprovação do programa do Governo, a eleição do presidente da AR, a aprovação do Orçamento do Estado ou as rejeições das moções de censura.

“Demos todas as condições para este Governo governar, mas dissemos que nunca viabilizaríamos uma moção de confiança”, reforça. E recorda que, mesmo assim, o PM decidiu apresentar a moção de confiança “sabendo que seria chumbada”. “Esta crise tem origem no PM”.

O líder do PS, falando das próximas eleições, Pedro Nuno diz que não devem ser encaradas como um “problema”, mas como uma “oportunidade de clarificação”. “É uma escolha entre dois projetos, duas lideranças”. O socialista reforçou a ideia de que é necessário escolher um “Governo duradouro que não esteja a prazo”. “É entre PS e PSD que se vai decidir a saúde da democracia”.

Entrando já em “modo” de campanha eleitoral, Pedro Nuno Santos atacou o PSD dizendo que o Governo não estrou em gestão esta semana, mas desde que o excedente orçamental se esgotou. “Quando o PS caiu, a economia crescia mais depressa, a dívida caía mais, os salários cresciam mais, o emprego cresceu mais em 2023 que em 2024”.

Ventura diz que PR foi “muito claro”

Por seu turno, André Ventura manifesta-se satisfeito com a marcação de eleições antecipadas para 18 de maio e diz que o Presidente da República foi “muito claro” ao deixar o ónus da crise política em Luís Montenegro.

“O Chega disse que a data não era relevante, mas que os portugueses saíssem rapidamente desta crise e o país ultrapassasse esta crise dramática. Não havia, de facto, outra solução, dentro do que o Presidente Marcelo tinha defendido para este tipo de situação. A dissolução da AR era a única alternativa”, afirmou.

“Esta declaração foi diferente de todas as outras, hoje Marcelo quis transmitir ao país que convocava eleições e dissolvia o Parlamento, mas a responsabilidade era do PM. A interpretação realista do que o PR hoje disse era importante que ficasse nos ouvidos dos portugueses”, advoga.

Reação dos restantes partidos

Em reação à comunicação do PR, Paulo Raimundo diz que não irá desperdiçar esta “oportunidade” que são as eleições antecipadas. “O PCP não vai desperdiçar a oportunidade de levar para o debate as dificuldades do povo, o acesso à habitação, à saúde, à educação, à vida melhor a que quem cá vive e trabalha tem direito”, salientou o secretário-geral do PCP.

Paulo Raimundo quis destacar uma das ideias de Marcelo Rebelo de Sousa durante o seu discurso desta sexta-feira: “a salvaguarda da democracia”. “Para isso é preciso responder a estes problemas concretos, sem isso não é possível aguentar a democracia”.

Pelo CDS, Paulo Núncio voltou a defender que caiu um Governo da AD “bom” que merece ser reconduzido nas eleições marcadas para 18 de maio. “Em 12 meses, este Governo fez mais do que o PS em oito anos. Este Governo merece ser reconduzido pelo trabalho bem feito, para continuar a crescer bem acima da média europeia, reduzir impostos para as famílias e empresas”, afirma o líder parlamentar centrista.

Já o Livre espera que exista uma “campanha eleitoral esclarecedora” e não um “debate de atirar culpas”. Rui Tavares apontou o dedo à ética do primeiro-ministro, interpretando que o Presidente da República também se dirigiu às dúvidas sobre a pessoa de Luís Montenegro, e deixou claro que espera que a campanha seja centrada nas ideias e não num “atirar culpas uns para os outros”.

No Parlamento, o coordenador do Livre reiterou que a crise política “tem origem numa crise ética, diretamente ligada à figura individual do primeiro-ministro”, e considerou que a crise “foi-se afunilando também por escolha” de Montenegro.

Por seu turno, o IL promete campanha pela “positiva” focada em soluções para os problemas do país. A líder parlamentar da IL, Mariana Leitão, sublinha que a IL apresentará “soluções de confiança que permitam acelerar o país e devolver esperança e confiança aos portugueses”.

Já Ines Sousa Real, deputada única do PAN, também culpou Luís Montenegro por ter apresentado uma moção de confiança que “jamais iria passar” e por ter preferido “esconder-se atrás dessa moção” em vez de se sujeitar ao escrutínio.

Para a coordenadora do Bloco de Esquerda, “o que se passou para justificar a crise não foi um conflito de opiniões” nem um conflito com “uns que acharam que esclarecimentos que não foram dados”. “Há, de facto, um problema ético”, argumentou Mortágua, recordando o caso em torno da Spinumviva e do recebimento de avenças “através de uma empresa na esfera pessoal” do primeiro-ministro. “Isso é uma matéria de facto e é importante que esses factos ficassem clarificados. É importante que a história triste desta crise política se escreva como ela realmente aconteceu”, reiterou.

A líder do BE mostrou-se satisfeita com as eleições marcadas para o dia 18 de maio, que permite tempo para “todas as burocracias e atos administrativos” dos partidos. “O BE irá, num curto espaço de tempo, aprovar listas e apresentar o seu manifesto eleitoral”, garantiu, prometendo “uma campanha de propostas e de soluções”.

História da crise

A mais recente crise política portuguesa começou com um escândalo envolvendo uma empresa da família do primeiro-ministro, Luís Montenegro, o que provocou acusações de conflito de interesses. Depois de duas moções de censura rejeitadas em menos de duas semanas, o Parlamento chumbou, na terça-feira, uma moção de confiança apresentada pelo governo minoritário PSD/CDS-PP, um dia e um ano após a vitória da coligação AD nas legislativas antecipadas de 10 de Março.

O Conselho de Estado integra, por inerência, o presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro, o presidente do Tribunal Constitucional, a provedora de Justiça, os presidentes dos dois governos regionais e os antigos Presidentes da República. A que se juntam os cinco cidadãos eleitos pela Assembleia da República – neste momento Francisco Pinto Balsemão e Carlos Moedas indicados pelo PSD, Pedro Nuno Santos e Carlos César nomeados pelo PS, e André Ventura, pelo Chega – e outros tantos designados pelo chefe de Estado – António Lobo Xavier, Joana Carneiro, Leonor Beleza, Lídia Jorge, e Luís Marques Mendes.

Não estiveram presentes na reunião a provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, assim como o antigo presidente do PSD, Francisco Pinto Balsemão, eleito conselheiro pelo Parlamento, e o líder do PSD-Madeira, Miguel Albuquerque, que se encontra em campanha eleitoral para as legislativas regionais. Já a maestrina Joana Carneiro, nomeada pelo Presidente, participa por videoconferência.

Foto: Presidência da República

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