Marcha do Beato está de volta e quer preservar as tradições da freguesia

Com uma equipa jovem e cheia de garra, a Marcha do Beato está de volta ao concurso das Marchas Populares de Lisboa 2025, após seis anos de interregno. A organização é do Grupo Recreativo e Cultural Onze Unidos, coletividade situada na Quinta do Ourives, liderada por Amílcar Mota, também ele responsável pela marcha. O objetivo, para além de ganhar o concurso, será divulgar as tradições do Beato e, sobretudo, conquistar um bom lugar na tabela, para que a “marcha continue nos anos seguintes”.

Já se afinam as vozes e ensaiam-se coreografias no Grupo Recreativo e Cultural Onze Unidos, coletividade que organiza, em 2025, a Marcha do Beato, uma das marchas que regressa à competição, após seis anos de interregno. A última participação foi em 2019, com o tema ‘O Zé do Beato namora a Maria Lisboa’, e que lhe valeu o 19º lugar na classificação geral. “Depois, meteu-se a pandemia, voltámos a concorrer em 2022 e em 2023 e não fomos sorteados”, recorda ao Olhares de Lisboa o organizador da marcha, Amílcar Mota.

“Era preciso reanimar a marcha, porque nestes bairros vive-se muito a tradição das marchas e dos santos populares e havia pessoas daqui que iam apoiar outras marchas. Quero que esta marcha seja de toda a freguesia”, reforça o dirigente, sublinhando que o Beato divide-se “pelo Vale de Chelas, a zona baixa da freguesia, e pela Picheleira, a zona alta”. Sem o Beato a concurso, “grande parte dos moradores da Picheleira eram apoiantes da Marcha do Alto do Pina, e os da parte de baixo normalmente eram apoiantes de Marvila”, explica Amílcar Mota, que quer que a Marcha do Beato ajude a trazer de novo o espírito bairrista para aquela freguesia.

Quando a organização soube que o Beato foi escolhido para participar nas Marchas Populares de 2025, “fizemos um apelo nas redes sociais, e tivemos uma grande adesão de marchantes, não estávamos à espera. Só de mulheres, tivemos cerca de 60 inscrições, e de homens, cerca de 30 e poucos”. Amílcar Mota fala de um grupo “bastante jovem”, sendo grande parte dos marchantes com idades sobretudo entre os “15 e os 30 anos, havendo naturalmente alguns mais velhos” e são residentes na freguesia ou com ligações à mesma. “Começámos os ensaios no dia 17 de março, com o canto, e há cerca de duas semanas, começámos a ensaiar as marcações”, acrescenta o também presidente do Onze Unidos.

“Queremos ser uma marcha tradicional”, afirma responsável da marcha

O grupo ensaia, durante o mês de abril, às segundas, terças, quintas e sextas, sendo que às segundas e sextas ensaia no pavilhão do Onze Unidos, na Quinta do Ourives, e nos outros dois dias ensaia na Escola Básica e Secundária Luís António Verney. A partir de maio, passam a ensaiar de segunda a sexta apenas na escola. “Acima de ganhar, quero que a marcha se mantenha, porque foram muitos anos sem ela”, diz Amílcar Mota, que espera, naturalmente, que o Beato consiga ter um bom resultado no concurso. “Nós queremos ser uma marcha tradicional, reviver um pouco as tradições da freguesia e mostrar tempos passados. A nossa freguesia está ligada ao rio, mas somos a única freguesia ribeirinha que, infelizmente, pouco ou nenhum acesso tem ao Rio Tejo”.

“Eu e muitas pessoas lembram-se perfeitamente da praia de Xabregas, do acesso que havia à praia e que hoje não temos. Se formos a Marvila, encontramos acesso ao Tejo, com paisagens bonitas e aqui no Beato só temos zona portuária, que tira o acesso ao rio”. Na sua opinião, “as marchas têm que demonstrar o que são e o que foram os costumes e o modo de vida das pessoas que viviam e vivem aqui”. Até ao momento, o melhor lugar conquistado no concurso foi o terceiro lugar, em 2003. “A partir daí, ficámos sempre em lugares modestos, no meio da tabela, até porque nunca fomos uma marcha com grandes investimentos”, conta o responsável, frisando que a marcha conta com o apoio de 50 mil euros que a Câmara de Lisboa dá a cada marcha, e ainda de apoios do comércio e outros patrocinadores locais.


‘Marcha vai apresentar-se à comunidade a 23 de maio

Para 2025, o Beato conta com o filho de Amílcar, Tiago Mota, como ensaiador. Já o sobrinho, Ruben Mota, está responsável pela cenografia e pelos figurinos. “É a primeira vez para eles e acho que isso tem muito valor, porque não é fácil entrar num projeto destes. É uma responsabilidade muito grande’, afiança o responsável da marcha. O Beato apresenta-se na Altice Arena no terceiro dia de exibições, 1 de junho, mas antes, a 23 de maio, irá apresentar-se ao bairro num ensaio geral aberto a toda a comunidade. “Vai ser importante para mostrar o trabalho que os nossos marchantes fizeram e para eles sentirem a responsabilidade [de representar o bairro]’.

A Marcha do Beato teve algumas participações pontuais no concurso das Marchas Populares durante o século XX, mas só em 2003 é que começou a participar de forma contínua. “O Beato já tinha marchas infantis, e através de uma parceria entre nós, o Ateneu da Madre Deus e o Vitória Clube da Picheleira – atualmente Vitória Clube de Lisboa –, decidiu-se então introduzir a marcha dos adultos’, recorda Amílcar Mota, sublinhando que este desiderato foi conseguido graças ao apoio da Junta de Freguesia do Beato.

Até 2012, a marcha foi organizada pelo Ateneu da Madre Deus, tendo passado esta responsabilidade para o Onze Unidos em 2012, que organizou a marcha nesse ano, bem como nos anos de 2013 e 2014. Em 2015, passou a ser novamente organizada pelo Ateneu da Madre Deus, até 2019. Em 2025, regressou às mãos do Onze Unidos, um espaço que funciona como polo agregador da comunidade. Amílcar Mota ressalva que este clube “pretende ser um espaço onde as pessoas daqui do bairro pudessem ter acesso à parte desportiva, à parte cultural, e à parte recreativa, é o que nós desenvolvemos aqui durante o ano todo’.

GRC Onze Unidos promove várias atividades

O Onze Unidos existe desde 1976 e surgiu com o objetivo de melhorar as “condições de vida dos jovens que viviam aqui no bairro, que era um bairro de barracas, com pessoas pobres’. “Nós tínhamos futebol, atletismo, clubes de ciclismo, boxe, tínhamos também os bailaricos que fazíamos semanalmente e depois também os torneios de futebol. Tivemos também futsal, em que chegámos à primeira divisão nacional. Atualmente, já não temos futsal porque é altamente dispendioso e não reunimos as condições para poder continuar’.

‘Nos dias de hoje, temos o jiu-jitsu, com séniores e com crianças, bem como luta livre olímpica, temos Zumba, e na área social temos a parte de acompanhamento aos idosos, fazemos passeios temáticos com eles, temos um atelier de pintura, e promovemos ainda, na parte recreativa, os matraquilhos, o snooker, as cartas, ou a malha’, ressalva. O Onze Unidos tem cerca de 500 sócios, e vive das quotizações dos mesmos, bem como do arrendamento do bar, e de alguns apoios da Junta de Freguesia e da Câmara Municipal.

Clube luta para conquistar direito de superfície da sede

O espaço onde está situado é propriedade do clube, mas a direção ainda luta para conquistar o direito de superfície do imóvel. “O direito de superfície do clube foi aprovado em Assembleia Municipal, mas na altura de fazer a escritura, era preciso pagar quase cinco mil euros e não tínhamos esse dinheiro’, lamenta Amílcar Mota, que chegou a pedir à Junta do Beato e à Câmara Municipal de Lisboa que ajudassem o clube a ultrapassar este problema, mas até ao momento ainda não conseguiram ver o assunto resolvido.

“Tentei pedir o estatuto de utilidade pública, pedi também apoios do Instituto Português do Desporto e da Juventude, para a realização de obras, mas foi tudo recusado porque o clube não tem o direito de superfície das instalações’. “Com o estatuto de utilidade pública, conseguimos ter acesso a outras vantagens, e deixamos de ficar presos neste marasmo e dar o salto’, lamenta o presidente do Onze Unidos, cargo que exerce há mais de 30 anos.’

 

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