Mais uma vez Agosto vê chegar a Paço de Arcos as Festas em honra do Senhor Jesus dos Navegantes. De tradição centenária, as mais antigas festas do concelho de Oeiras, são um exemplo de comunhão perfeita entre raiz religiosa e carácter profano e popular, que voltam a celebrar, a identidade única que os habitantes de Paço de Arcos ao longo dos séculos foram construindo.
Entre 23 de Agosto e 1 de setembro, o Jardim e a Vila de Paço de Arcos acolhem os festejos e celebrações religiosas naquela que é apelidada pelos seus habitantes como “a mais charmosa vila de Portugal.”
Com uma programação pensada para todos, a animação cultural e recreativa oferece aos públicos de todas as idades motivos para uma inesquecível visita, afirma Madalena Castro, presidente da União das Freguesias de Oeiras e São Julião da Barra, Paço de Arcos e Caxias
“Este ano, trabalhamos para que a oferta fosse ainda mais diversificada e apelativa. Na gastronomia a variedade é enorme. Do algodão doce, ao pão com chouriço, das tradicionais farturas aos pratos regionais, todos encontram uma sugestão deliciosa para um jantar de amigos ou uma refeição leve depois de um dia na praia ou no trabalho”, revela a edil.
Segundo a presidente da União de Freguesia, “os 150 anos das Festa do Senhor Jesus dos Navegantes são reveladores da força de uma comunidade, porque são umas festas centenárias que celebram, para além da reunião da população de Paço de Arcos, o Senhor Jesus dos Navegantes, padroeiro dos homens do mar. As festividades religiosas são sempre um marco, de causa maior, neste encontro”.
As festas – lembra – “começaram por ser de cariz religioso, de agradecimento ao Senhor Jesus, mas que são também uma recordação e um agradecimento ao mestre Joaquim Lopes, que foi um grande homem do mar, que notabilizou a fama de Paço de Arcos em todo o país, pelo número de pessoas a quem salvou a vida na entrada da barra e na entrada do Tejo”.
Olhares de Oeiras – As pessoas ligadas ao mar desta comunidade têm uma grande devoção ao seu patrono e uma arreigada religiosidade?
Madalena Castro – Tenho algumas dificuldades em responder, mas acho que a componente da religiosidade foi mais acentuada no passado, há cem anos. Atualmente, continua a existir, mas, todo o modo, a atividade piscatória foi reduzida e os homens com ligação ao mar não é tão grande, até porque as dificuldades e o perigo aliado a esta atividade levam-nos a ter uma ligação à fé mais arreigada do que quando a atividade profissional é mais tranquila e menos arriscada.
Esta festa combina o sagrado e o profano. Talvez por essa razão tenha resistido este século e meio?
Esta festa faz parte do sentir da comunidade e são, principalmente, festas religiosas. Obviamente que tem uma componente cultural, tem uma componente de gastronomia, mas também de diversão para as crianças, juventude e adultos.
Estas festa trazem muita gente de fora de Paço de Arcos, mas são, marcadamente, festas religiosas.
Quais são os eventos que destaca?
Ao nível das celebrações religiosas, destacam-se as procissões, nomeadamente a procissão do Mar, no dia 31 de agosto, com diversas embarcações a participar e que termina na Praia dos Pescadores, onde o Cristo simbólico dos Senhor dos Navegantes, desembarca na baía de Paço de Arcos. Depois, temos uma procissão a pé pelos arruamentos mais antigos da vila.
Como destaque dos momentos profanos, temos o fogo de artifício, na noite de sábado, que foi mudado de domingo para a noite de sábado por respeito aos moradores que, no dia seguinte, têm de trabalhar. Este fogo de artifício, que durará de 10 a 15 minutos, tem uma importância simbólica muito grande porque acontece na baía da Praia dos Pescadores, onde vai desembarcar o Senhor dos Navegantes.
A Junta está sempre associada a este acontecimento?
A Junta de Freguesia é a principal organizadora do evento, na parte profana, cultural e da diversão. A Igreja, através da Paróquia da vila, trata da organização da faceta religiosa da festa.
Mas há outras organizações cívicas de Paço de Arcos que também colaboram na organização do evento, como a Associação Humanitária dos Bombeiros de Paço de Arcos, os Escuteiros, a Oeiras Viva, que nos vai ajudar na organização da Procissão Marítima, a Cáritas de Paço de Arcos, os SIMAS, e, obviamente, a Câmara Municipal de Oeiras, que é o grande patrocinador do evento.
Qual é o investimento?
A Junta de Freguesia gastou 50 mil euros e a Câmara 70 mil. A profissionalização da feira retirou algum peso à verba despendida pela Junta, como nos anos anteriores. Pois autarquia chegou a gastar 120 mil euros.
Desde o ano passado, que a autarquia delegou as competências organizativas em empresas privadas, pois a junta não tinha capacidades técnicas para continuar a gizar toda a componente cultural da Festa.
A junta não tem quadros suficientes, nem com as qualificações técnicas necessárias, para organizar toda a parte logística do evento. A Junta não tem técnicos de som, nem agentes de artistas, para contratar artistas ou organizar os concertos. Acho por bem entregar esta parte a outras entidades e ainda bem que assim foi, porque poupámos uma verba considerável para organizar um evento desta dimensão. Não somos uma entidade organizadora de eventos, somos uma autarquia que está ao serviço dos cidadãos e cuja missão está no serviço público, particularmente na dimensão social e de apoios vários aos nossos fregueses”.
Nos divertimentos, os carrosséis fazem a alegria dos mais pequenos, enquanto no espaço do ringue acontecem atividades de carácter lúdico. À noite vamos ter espetáculos ao vivo durante as 10 noites das Festas, nas áreas da World Music, Rock, Música Popular, Fado e Dança.
Contudo, estes são também dias de homenagem, lembrança e agradecimento. Ao primeiro mordomo destas Festas, Patrão Joaquim Lopes, homem que tantas vidas resgatou ao mar com permanente bravura e dedicada abnegação. Nunca ausente da memória dos Paço D’Arcoenses, dedicam-se também estes festejos a este herói nacional.
Da preservação da tradição, à inovação, à celebração da infância e da juventude, as Festas do Senhor Jesus dos Navegantes acolhem todos os que nos visitam com a certeza de aqui vão passar momentos de celebração e diversão.
Agradecemos ao Município de Oeiras, à Paróquia de Paço de Arcos, à Sogapal, ao Simas, aos Bombeiros Voluntários de Paços de Arcos e a todos quantos colaboraram na organização deste evento.
Homenagem ao Patrão Joaquim Lopes
Joaquim Lopes nasce em Olhão no ano de 1798, aos 10 anos já andava na faina do mar, aos 19 anos emigrou como pescador para Gibraltar, mas, sem sucesso, pelo que aos 21 anos foi viver para a Vila de Paço de Arcos, onde já viviam muitos algarvios e onde trabalhou como remador da falua do Bugio que fazia o aprovisionamento do Forte do Bugio.
O seu primeiro ato de heroísmo acontece aos 25 anos, em Oeiras, na data de 29 de julho de 1823, quando um homem na foz da ribeira de Oeiras, pretendeu atravessar com o filho às costas. Ambos teriam morrido se não fosse a rápida intervenção de Joaquim Lopes que trouxe primeiro o miúdo para terra e depois foi buscar o pai que já se debatia com dificuldade.
Tempos depois estava ele no farol do Bugio, quando um cabo de artilharia foi arrastado pelo mar. Joaquim Lopes pediu aos companheiros para segurarem na ponta de um cabo, lançou-se à água e recolheu o homem que estava a ser atirado contra os rochedos. Embora fosse o remador mais jovem, subiu ao cargo de Patrão da Falua do Bugio em 1833.
Em 1856 numa noite de tempestade, acordou com os tiros de alarme no Bugio e em S. Julião, algo se passava no seu mar. Joaquim Lopes, o seu filho Quirino e alguns voluntários, meteram-se ao mar na Falua e enfrentaram a tormenta. A escuna inglesa Howard Primorose, encalhara no Bugio ficando desmantelada, seis horas de luta com as ondas e não se conseguiam aproximar, o Patrão decide voltar a Paço de Arcos e buscar a sua lancha de pesca, mais rápida nas manobras, mais seis horas de luta, chegam aos destroços de onde salvam 5 marinheiros e o capitão, ao fim da tarde chegam a Belém.
Mais tarde foram agraciados pelo governo Inglês com a medalha de prata da Rainha Vitória, Joaquim Lopes foi condecorado pelo nosso governo.
Anos mais tarde a escuna inglesa British Queen, encalha no Bugio no meio de tremenda tempestade, não se conseguindo aproximar, veem desaparecer um a um os membros da tripulação, conseguem salvar o capitão e um cão.
A França concedeu-lhe a medalha de “Dedicação e Mérito” por ter salvo parte da tripulação do Esthefanie que se partira todo junto ao Bugio.
Foi pedido um salva-vidas porque a falua era pesada, o salva-vidas foi colocado erradamente em Belém, pois quando chegava ao local, já os Lopes tinham efetuado os salvamentos.
Em 1859 o salva-vidas é colocado em Paço de Arcos sob as ordens do Patrão.
Pelo salvamento do Bergantim espanhol Achiles foi concedida a medalha de ouro de “Distinção Humanitária” pelo governo espanhol.
Tempos depois salvam toda a tripulação do iate português Almirante. El Rei D. Luís reconhece-lhe o seu valor e coloca-lhe, em 1862, sobre os ombros o colar de “Oficial de Torre e Espada”, Joaquim Lopes comovido chora nos braços do Rei.
A sua questão económica é colocada no parlamento e é concedida uma pensão anual de 240 mil reis, por fim o governo irá graduá-lo em 2º Tenente da Armada.
Aos 84 anos já não vai tanto ao mar, será o seu filho Quirino que o substituirá no salva-vidas. Despede-se dos salvamentos, num dia em que o seu filho se encontra em Belém com a Falua, ele não hesita, manda tocar o sino a rebate, vai às costas de um dos seus homens e é amarrado ao leme do salva-vidas, para salvar o lugre inglês Lancy, ao ouvir o sino Quirino regressa para colocar o pai na Falua e vai salvar com o salva-vidas a tripulação do lugre.
A morte espera-o no ano de 1890 aos 92 anos de idade, dois anos antes da criação do Instituto de Socorros a Náufragos.
Em Paço de Arcos reúnem-se 4 vapores que acompanharão o salva-vidas com o cadáver. Seguirá para o cemitério dos Prazeres, sempre acompanhado por El Rei D. Carlos. Mais tarde será trasladado para o cemitério de Oeiras, onde será erigido um mausoléu.