A água como setor estratégico de “soberania” dos países

As incertezas da geopolítica e as alterações climáticas obrigarão a rever os paradigmas e as afirmações perentórias de que a inovação tecnológica “tudo resolve”. Nuno Brôco sustenta que a preservação dos recursos hídricos é garantia de soberania nacional.  

Realiza-se hoje, dia 25 de setembro, na Fábrica de Água de Alcântara, em Lisboa, a conferência o “Caminho da Inovação” 2025, sob o tema “Desafiar o Óbvio”.

A conferência “O Caminho da Inovação” é hoje um espaço único de encontro entre empresas, academia e sociedade para pensar a água de forma circular, eficiente e sustentável.

Em declarações ao “Olhares de Lisboa”, o presidente do conselho de administração da Águas do Tejo Atlântico, Nuno Brôco, salienta que esta iniciativa tem como propósito “motivar as pessoas a pensarem fora da caixa”, desafiando-as a questionarem “o óbvio” e os “paradigmas em que acreditamos e que, muitas vezes, são menos sólidos do que que aquilo que pensamos”.

“Mais importante do que as soluções tecnológicas, hoje vamos discutir novas formas de atuar no setor da água. Muitas vezes, focamo-nos naquilo que é palpável e mantemos os paradigmas do passado”.

“Respeito pelos profissionais do setor”

Para Nuno Brôco, os consumidores também deverão mudar a forma como olham para os trabalhadores do setor da água. “Acima de tudo, as pessoas deveriam ter mais respeito pelos profissionais do setor água, que são esquecidos pelo utilizador, quer do lado do abastecimento, quer do lado do saneamento. Por exemplo, ao colocar na sanita ou no esgoto produtos ou matérias que não podem ser tratados como água, e que claramente não são água, põem em causa o trabalho e o esforço de todos os profissionais do setor. Temos, todos nós, que contribuir para cuidar deste ativo fundamental e estratégico, que é a água”, refere o responsável.

Até porque, sublinha Nuno Brôco, futuramente prevê-se um agravamento da escassez da água em todo o mundo e os países que conseguirem gerir convenientemente este recurso, terão menos dificuldades em enfrentar as secas e a escassez da “fonte da vida”.

As incertezas da geopolítica

Na sessão de abertura da conferência, Nuno Brôco explica que o evento põe assento tónico no tema “para além do óbvio”, porque aquilo que é dado como adquirido, “e óbvio”, nem sempre corresponde à realidade.

“Vivemos no tempo em que aquilo que nos parecia ser ‘óbvio’ há alguns meses, mas hoje deixou ser assim tão claro. Por exemplo, em Portugal, o verão era a estação e tínhamos temperaturas elevadas, pouca chuva. Havia este padrão, mas hoje já não é assim e temos que nos adaptar a esta mudança”, exemplifica.

Também a nível da geopolítica, “era ‘óbvio’ que vivíamos num continente (europeu) com estabilidade e com ausência de guerra, que muito nos confortava, vivíamos sem pensar em guerras, mas a realidade mudou. Vivíamos num contexto onde não nos passava pela cabeça haver um presidente dos EUA a perguntar ‘qual é a função da ONU?’. Em suma, a geopolítica tem nos trazido muitas surpresas e que considerávamos como coisas ‘óbvias’ há alguns dias ou meses”.

A água como garantia da “soberania”

No setor da água, Nuno Brôco salienta que pouca coisa se deve pôr na “prateleira” das coisas garantidas, uma vez que tem havido alguma reversão do “respeito pelos padrões ambientais”. “Pensávamos que seria ‘óbvio’ que nós, enquanto sociedade, teríamos evolução nesta matéria, mas temos assistido a alguns comportamentos que, a mim, não me dão garantias de que estejamos no caminho da evolução”.

O administrador adverte que, dada a perspetiva de cenários futuros, conseguidos através da inovação, o setor da água torna-se, ainda mais, como um setor estratégico de “soberania” do país. “Estou convicto que, atualmente, a inovação deverá focar-se no objetivo crítico da resiliência, na preservação de um ativo crítico de um país. Temos a obrigação de nos prepararmos para cenários de crise que, apesar de não desejados, podem acontecer”.

União dos setores estratégicos do país

A opinião do presidente do conselho de administração da Águas de Portugal (AdP), António Carmona Rodrigues, não diverge muito de Nuno Brôco. O administrador e ex-presidente de Câmara de Lisboa refere que o “apagão de abril” pôs em evidência a necessidade de concertação de esforços, do “jogo de equipa”, de todos os setores estratégicos do país, como os energéticos, a proteção civil e a água, na resolução conjunta de problemas que possam ocorrer.

Carmona Rodrigues aproveitou para revelar que o Governo está a pôr em marcha o projeto “A Água que Une”, que representará, uma alavancagem na inovação do grupo Águas de Portugal.

“A ministra do Ambiente irá anunciar brevemente a medida, que vai representar uma mudança na vida da empresa”, defende.

Seis centenas de participantes

A conferência tem a participação de 600 pessoas, nacionais e estrangeiras. Conta com especialistas nacionais e internacionais que estão a partilhar ideias, soluções e projetos que estão a transformar o futuro da água.

Entre os destaques, a intervenção de Angela Macoscar, diretora de Inovação da Northumbria Water (Reino Unido), como keynote speaker.

O evento pode ser acompanhado em direto via streaming AQUI 

 

 

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