O Governo “odeia o 25 de Abril”, acusa Vasco Lourenço

O presidente da Associação 25 de Abril acusou ontem o Governo de faltar ao compromisso assumido de criar um centro interpretativo sobre a Revolução dos Cravos. Vasco Lourenço acusa o Governo de “não ser pessoa de bem” e de “não querer o 25 de Abril”. “Eles odeiam o 25 de Abril”, atira, classificando como “uma palhaçada” a nova comissão para celebrar o 25 de Novembro.

Em conferência de imprensa na sede da Associação 25 de Abril, em Lisboa, que contou com a presença com vários capitães de Abril, Vasco Lourenço manifestou a sua indignação face à posição do Governo, relativamente à construção do Centro Interpretativo do 25 de Abril, que acusou de “não ter palavra” e de não “cumprir os compromissos assumidos”. Mais, o militar foi ainda mais longe no tom das acusações e considera que “este Governo não é pessoa de bem”.

O militar acusou o executivo de ter decidido “de forma unilateral e arbitrária, não cumprir o compromisso oficialmente assumido” de instalar o Centro Interpretativo do 25 de Abril nas atuais instalações do Ministério da Administração Interna (MAI), na Praça do Comércio, em Lisboa.

Segundo Vasco Lourenço, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, comunicou recentemente à associação que “por razões de segurança”, não especificadas, o MAI já não vai sair das atuais instalações.

“Empurrar com a barriga”

O Governo tenciona, segundo a associação, utilizar a zona ocidental da Praça do Comércio para “instalar serviços culturais”, após a saída do Ministério da Agricultura deste local para o ‘Campus XXI’, (Av. João XXI, em Lisboa), prevista para 2027.

A associação foi informada de que uma “hipótese viável” para o executivo é destinar parte dessas instalações a este centro interpretativo, solução que só poderá ser analisada após as eleições autárquicas de 12 de outubro, devido ao envolvimento da Câmara Municipal de Lisboa na questão. Está também a ser estudada a hipótese de instalar este centro noutro ponto do país.

Para Vasco Lourenço, esta posição dúbia do Governo não augura vontade de efetivamente se avançar com a construção do Centro.

O Governo está a “empatar” e “a empurrar com a barriga” esta situação, o que faz com que o Estado, “por ação do seu poder executivo, se transforme numa entidade não credível” e “não confiável”, faltando à sua palavra.

“Eu não sei viver num país desses, em que os principais responsáveis não cumprem os compromissos que assumem”, criticou.

Comissão para celebrar o 25 de Novembro “é uma palhaçada”

O coronel Vasco Lourenço criticou ainda o executivo por ter criado “inesperadamente” uma comissão para assinalar os 50 anos da operação militar de 25 de Novembro de 1975, “ignorando todos os compromissos assumidos, nomeadamente as competências da Comissão Nacional e da Comissão Executiva (dedicadas aos 50 anos do 25 de Abril de 1974)”.

Lembrando que o programa das comemorações oficiais do cinquentenário da Revolução dos Cravos já previa assinalar o 25 de Novembro de 1975, Vasco Lourenço classificou como “uma palhaçada” a criação de uma nova comissão e chegou mesmo a acusar o Governo PSD/CDS-PP de querer deturpar a história do país e de dizer “inverdades”.

“Eu não digo que eles desconheçam a História. Eu digo que eles querem deturpá-la. Se não conhecem, não podem estar no Governo. Pessoas deste tipo, com esta ignorância, não podem estar no Governo”, criticou.

Vasco Lourenço lembrou que a resolução do Conselho de Ministros do passado dia 08 de setembro, que criou esta nova comissão, referia que o 25 de Novembro permitiu realizar as primeiras “eleições livres e democráticas em Portugal, por sufrágio direto e universal” a 25 de Abril de 1976, omitindo o sufrágio para a Assembleia Constituinte, realizado no ano anterior.

A frase foi entretanto retificada pelo Governo, que especificou que se estava a referir às primeiras eleições “legislativas” livres, mas para a Associação 25 de Abril existiu uma justificação para tal lapso: “O 25 de Novembro que vão comemorar pretende ostensivamente ignorar a verdade histórica e tudo o que signifique liberdade, partidos políticos, democracia e fim da guerra, isto é, a essência do 25 de Abril”, até porque, na verdade, as primeiras eleições livres realizadas em Portugal ocorreram em abril de 1975.

Para Vasco Lourenço, a atitude do Governo reflete a sua oposição à Revolução de Abril, querendo “apagar” a data da memória coletiva portuguesa “Para eles, só houve liberdade depois do 25 de Novembro”, o que é profundamente “revelador” do “ódio ao 25 de Abril”.

Mas o capitão de Abril lembra que as comemorações dos 50 anos da data, este ano, contaram com mais 200 mil pessoas nas ruas de Lisboa.

Vasco Lourenço considera a revolução portuguesa como “um caso único no mundo”. Os militares derrubaram a ditadura e devolveram o “poder ao povo”, um gesto ímpar e que não deveria ser esquecido. Só por isso, merecia mais respeito de “quem nos governa”.

Obviamente, demito-o

Questionado sobre a posição do Presidente da República neste processo, Vasco Lourenço iliba Marcelo Rebelo de Sousa de qualquer responsabilidade, enaltecendo inclusive o papel da primeira figura do Estado em todo o quadro das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.

Não obstante, diz que o número de casos e de “casinhos” do Governo liderado por Luís Montenegro já merecia uma “dissolução do Governo”.

“Se fosse eu Presidente da República, já o tinha demitido”, atira.

Classificando a atitude do Governo como “inqualificável e incompreensível”, Vasco Lourenço reitera: “Eles não querem o 25 de Abril, odeiam o 25 de Abril”.

CI25 Abril iria rivalizar com o Mosteiro dos Jerónimos

Relativamente ao Centro Interpretativo do 25 de Abril, o militar não tem dúvidas de que seria “um rotundo sucesso”, dado o interesse de pessoas “do mundo inteiro” por “tudo o que diga respeito ao 25 de Abril.

O coronel que lidera a Associação justifica o seu entusiasmo com a construção deste equipamento cultural e histórico com os “10 milhões de visitas” que o site da Associação já teve e pelo interesse dos turistas (nacionais e estrangeiros) em visitar e percorrer os locais da cidade de Lisboa mais emblemáticos diretamente ligados ao 25 de Abril.

“Chamem-me megalómano, mas acredito que o Centro Interpretativo do 25 de Abril iria rivalizar com o Mosteiro dos Jerónimos no número de visitantes”, assegura.

No final da conferência de imprensa, Vasco Lourenço lamentou a ausência das televisões (privadas) na iniciativa, mas ironizou dizendo que “entendia” porque “devem estar todas em volta do José Mourinho”. O jornalista da RTP retorquiu, dizendo que estava presente o “serviço público” de televisão.

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