Eleições autárquicas ‘encurtam’ comemorações do 5 de Outubro

“A República e a Democracia estão hoje bem vivas em Portugal, mas para que assim continue precisamos de renovar o nosso compromisso com os seus ideais e os seus valores, sempre com atenção aos novos desafios e à necessidade de estar à altura, na prática política e constitucional, daqueles princípios”, pode ler-se na mensagem publicada este domingo no site da Presidência da República.

Portugal comemorou esta domingo, 5 de Outubro, os 115 anos da implantação da República com uma cerimónia de içar da bandeira na Praça do Município, em Lisboa. Não houve discursos oficiais devido à campanha para as eleições autárquicas, que se realizam dentro de uma semana.

No dia da revolução de 5 de Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa defende que é preciso “renovar o compromisso” com os ideais e valores da República. Uma mensagem deixada numa nota publicada ao final da manhã no site da Presidência da República quando decorria, na Praça do Município, em Lisboa, a sessão solene evocativa da Implantação da República ― que este ano decorreu num formato encurtado, devido ao período de campanha eleitoral.

A opção pela eliminação dos discursos visou evitar que, na ponta final da campanha, a uma semana das eleições, “se possa dizer que qualquer coisa que suceda tenha a ver com a campanha eleitoral”, explicou o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, há cerca de um mês, quando revelou os contornos da sessão.

Na cerimónia estiveram presentes os chefes de Estado e de Governo, Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Montenegro, além do presidente da Assembleia da República, representantes de outros órgãos de soberania, e os autarcas de Lisboa (Câmara Municipal e Assembleia Municipal).

Esta não é a primeira vez que não haverá discursos numa cerimónia do 05 de outubro. A última foi em 2019, em que não houve igualmente intervenções oficiais por decorrer na altura a campanha para as eleições legislativas.

Passos Coelho cortou feriado

Este feriado foi proclamado logo em 1910, uma semana depois de a República ter sido implantada. Foi assinalado durante mais de 100 anos até que, em 2012, com efeitos a partir do ano seguinte, o Governo liderado por Pedro Passos Coelho decidiu suprimi-lo, bem como a outros três – Corpo de Deus (feriado móvel celebrado em junho), Dia de Todos os Santos (1 de novembro) e a Restauração da Independência (1 de dezembro) -, com a justificação de que esta medida reforçaria a competitividade e a produtividade da economia portuguesa.

Em 2016, já sob a chefia de António Costa, o Governo socialista fez regressar os quatro feriados.

Além de Lisboa, onde a Assembleia da República comemora a Implantação da República com a abertura do Palácio de São Bento para visitas livres, exposições, música, atividades lúdicas e dança, estão previstas cerimónias em outros municípios, nomeadamente em Loures, onde a 4 de outubro de 1910 a Junta Revolucionária tomou os Paços do Concelho de Loures, içando bandeira republicana, hasteada por Joaquim Augusto Dias, e declarou a Implantação da República, um dia antes da proclamação oficial do país, a 5 de outubro.

Da crise monárquica à proclamação da República

A República foi implantada em Portugal em 1910, colocando um ponto final nos vários séculos de História da monarquia portuguesa. A contestação social inflamada por uma ameaça britânica levou ao regicídio, em 1908, um evento determinante para o que viria a acontecer no dia 5 de Outubro de 1910, uma data assinalada com um feriado nacional.

Para percebermos o que levou ao acontecimento que ficaria eternizado na História de Portugal a 5 de Outubro de 1910 é preciso recuar alguns anos.

No final do século XIX, crescia no velho continente o movimento republicano, que desafiava as várias monarquias ainda em vigor. Nessa época, o ambiente político e social em Portugal não era, de todo, o mais saudável, mas um evento viria a contribuir – e de que maneira – para o fim da monarquia.

O ano de 1890 entrou para os registos históricos quando Inglaterra, aliada do reino lusitano há vários séculos – desde o Tratado de Windsor, assinado em 1386 – fez um ultimato a Portugal: ou os portugueses retiravam as suas tropas dos territórios situados entre Angola e Moçambique (mapa cor de rosa), ou assistir-se-ia ao rompimento das relações entre os dois Estados.

Face ao poderio inglês, o Governo luso, apoiado por D. Carlos, decidiu retirar, de imediato, o exército da área exigida. Esta decisão gerou reações negativas por parte de movimentos nacionalistas, o que contribuiu para o adensar da contestação popular para com a Coroa.

Assassinado de D. Carlos

Dezoito anos depois do marco histórico que ficou conhecido como ‘Ultimato Inglês’, mais concretamente a 1 de fevereiro de 1908, o monarca D. Carlos e o príncipe herdeiro, Luís Filipe, foram assassinados a tiro no Terreiro do Paço, em Lisboa, quando regressavam de uma estadia em Vila Viçosa.

D. Manuel II, filho mais novo de D. Carlos, ainda subiu ao trono, mas não conseguiu inverter o crescente clima de instabilidade que reinava na sociedade portuguesa.

O movimento republicano emergia na Europa e, em Portugal, ganhava expressão a todo o vapor, muito por culpa do Partido Republicano, que não permitia que o novo monarca lograsse sucesso, afirmando-se cada vez mais como uma alternativa de poder.

O clima era insustentável e o que aconteceria a 1910 já se adivinhava. A 4 de outubro desse ano, republicanos, apoiados por revoltosos do exército e da Marinha, saíram a rua e exigiram uma mudança política para o país.

Às primeiras horas do dia que antecedeu a Implantação da República, mais de 2.000 homens ocuparam zonas estratégicas da capital e, ao fim do dia, aconteceu o primeiro confronto entre elementos dos dois lados do conflito. Como possuíam menos poder de fogo, os soldados pró-monarquia tiveram de recuar.

A Marinha bombardeou também por diversas vezes o Terreiro do Paço e o Palácio das Necessidades, o que foi enfraquecendo as pretensões dos monárquicos. Durante a manhã de dia 5 de outubro, um novo confronto entre os dois blocos confirmou a superioridade dos republicanos.

As forças fiéis à Coroa ainda resistiram às investidas dos revoltosos, mas pelas 09:00 foi aclamada a República, a partir da varanda da Câmara Municipal de Lisboa.

Após a queda oficial da monarquia, a Família Real partiu para o exílio e foi formado um Governo provisório encabeçado por Teófilo Braga.

No ano seguinte, o Parlamento, que elegeu Manuel de Arriaga como Presidente, aprovou a nova Constituição, dando, assim, início à Primeira República – viria a terminar com o golpe de 28 de maio de 1926.

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