Campo de Ourique é o retrato da pressão imobiliária em Lisboa. Todavia, os moradores «adoram» a vida de bairro e estão orgulhosos com a sua popularidade. Queixas só há uma: o estacionamento. A Junta promete mais lugares de estacionamento e quer o Metro.
Em Campo de Ourique são visíveis as marcas de uma forte presença francesa. Aliás, a fama de bairro francês de Lisboa já ninguém lha tira. É normal, no Jardim da Parada, ouvir-se a língua de Voltaire. Um palrar que se mistura com o dos outros habitantes, turistas e residentes chegados de outras paragens.
Números oficiais mostram que há «cerca de mil cidadãos franceses residentes no bairro». São os inscritos na secção consular da Embaixada de França e representam «pouco menos de um terço dos franceses residentes no município de Lisboa». No entanto, a representação oficial admite que «o número poderá ser um pouco superior». Ninguém tem o número exato, apenas existe uma certeza: Campo de Ourique é um dos bairros de eleição dos franceses que vivem em Lisboa. Uma das explicações relaciona-se com a proximidade do Liceu Francês Charles Lepierre.
Estatuto social
Mas, viver em Campo de Ourique é também, nos últimos anos, sinónimo de algum «status social». Pois, os preços das casas na freguesia subiram em flecha devido há grande procura. Casas antigas recuperadas e novos prédios chamaram novos habitantes. O bairro ganhou população mais jovem. Também algumas ruas com comércio vibrante, novos negócios, um mercado municipal rejuvenescido, fizeram deste um bairro da moda.
Os habitantes, mesmo os que vivem no bairro há mais tempo, gostam desta nova dinâmica e apreciam a oferta de comércio e serviços que existe, havendo poucas críticas a apontar. A única situação que merece a condenação unânime é a falta de estacionamento.
A freguesia e a República
A freguesia de Campo de Ourique, criada em 2012, abrange as antigas freguesias de Santa Isabel e de Santo Condestável. O chamado bairro de Campo de Ourique, projetado por Frederico Ressano Garcia, após a implantação da República em 1910, compreendia o retângulo entre as ruas Ferreira Borges e Tomás de Anunciação, Campo de Ourique e Saraiva de Carvalho.
Hoje, a freguesia de Campo de Ourique ocupa a quase totalidade do território que em 1741 foi atribuído à então criada Freguesia de Santa Isabel, desmembrada séculos mais tarde, em 1959, para dar origem à Freguesia de Santo Condestável. Agora, com a reorganização administrativa da cidade de Lisboa, passa a existir apenas a Freguesia de Campo de Ourique.
Foi no bairro de Campo de Ourique que começou o movimento revolucionário de 5 de outubro de 1910, de implantação da República.
Dois dos regimentos “históricos” que ocuparam o Quartel, o 4 de Infantaria e o de Infantaria 16, ficaram perpetuados em arruamentos. A estátua da Maria da Fonte foge a este cenário, representa a heroína popular, colocada no Jardim Teófilo Braga, vulgarmente conhecido por Jardim da Parada, por ter sido o antigo terreiro da parada do quartel.
Durante a Primeira República, consolidaram-se no Bairro as tradições republicanas e reivindicativas de Campo de Ourique – em 1914 ocorreram aqui diversas greves, protestos e outras manifestações populares, o primeiro desafio do movimento operário ao governo de Afonso Costa.
Durante a II Guerra Mundial, Campo de Ourique serviu de refúgio a muitos judeus e, mais tarde, em 1958 foi vivida com afã a campanha eleitoral de Humberto Delgado. De 1969 a 1973 a força da oposição centrava-se na freguesia, onde ficava a sede da CDE (Comissão Democrática Eleitoral).
Importantes foram também os cafés e os encontros de tertúlias que neles se realizaram – “Café Latino”, “A Tentadora”, “Ruacaná”, “O Canas”. Por outro lado, aqui se sediaram movimentos patrióticos e republicanos, além de muitos nomes ligados à cultura e política portuguesa aqui terem morado ou participado em atos de relevo.
O nº 16 da Rua Coelho da Rocha acolheu Fernando Pessoa (o edifício foi remodelado e é hoje um espaço cultural, a Casa Fernando Pessoa); na Rua Almeida e Sousa habitou o matemático e democrata Bento Jesus Caraças.
Dos monumentos e locais de interesse da freguesia destaca-se a Igreja do Santo Condestável, monumento emblemático e a Igreja de Santa Isabel. Até 2010 existia aí o edifício do antigo Cinema Europa edificado na década de 30 e redesenhado pelo arquiteto Carlos Antero Ferreira em 1958, com escultura de Euclides Vaz.
O melhor são os espaços verdes
Os espaços verdes são um dos pontos fortes de Campo de Ourique, afirma Ricardo Silva, 59 anos, reformado, residente na Rua Saraiva de Carvalho. Segundo ele, são espaços onde “as pessoas podem repousar, conversar. E tudo isso se reflete no dia a dia”. “Tem também os seus estabelecimentos” comerciais, sublinha este morador.
“É uma zona bem habitável”, muitas pessoas gostam de viver aqui”, adianta.
As mudanças provocadas pelo desaparecimento de alguns prédios, “permitiram o aparecimento de novas habitações”, considera Ricardo Silva, chamando a atenção para a grande oferta comercial existente no bairro, com destaque “para os cafés, restaurantes e o mercado de Campo de Ourique”.
«Nada nos falta…»
António Machado, de 68 anos, da Rua Francisco Metrasse, é um habitante recente de Campo de Ourique. Antigo morador na da Madragoa obrigado a mudar de casa, por «força» do contrato de arrendamento. Mas, como faz questão de salientar, Campo de Ourique está longe de ser um sítio desconhecido uma vez “que trabalhou na freguesia mais de 30 anos”.
Como pontos positivos sublinha o facto de “ser um bairro mais plano, em comparação com o outro onde morávamos”. Também “temos aqui mais oferta de comércio e vida é melhor aqui”. Por isso, considera que este bairro oferece tudo o que precisam e não sentem a falta de nenhum serviço.
Crianças ainda brincam na rua
Morador recente no bairro, nos três anos que tem de vivências na freguesia o economista Ricardo Gameiro, de 26 anos, morador no Jardim da Parada, considera que este “é um bairro à moda antiga. As crianças brincam na rua. Tem pessoas de todas as idades a desfrutar do bairro. Tem restaurantes ótimos. Vive-se o espírito de bairro entre os moradores”, salientando que “é uma zona calma e é seguro”. Ricardo Gameiro defende que o bairro tem uma boa oferta de serviços: “Tem ginásios, supermercados, piscina municipal, escolas. Acaba por existir um pouco de tudo neste bairro”. O único senão do bairro, prende-se com o estacionamento: “um pouco complicado”.
Trotinetes precisam-se!!!
Ser um “bairro central e pacato” são os pontos mais positivos para Gil Jorge, de 37 anos, empregado de escritório, da Rua 4 da Infantaria. Também a nível de serviços considera que a “oferta bastante completa”. Todavia, considera a “falta de lugares de estacionamento como um dos problemas mais complicados da freguesia. Pensa que se devia incentivar as pessoas a utilizarem menos o carro: “Isto dos carros é bom, mas devia-se incentivar mais as pessoas a usar as trotinetes”. E, por isso, propõe: “Por, exemplo, quem tivesse o passe não pagaria o uso da trotinete. Isto incentivaria o seu uso em distâncias curtas”.
A “Capital” de Lisboa
Joaquim Miguel, de 62 anos, comerciante, da Rua Ferreira Borges, não poupa nos adjetivos sobre o bairro que o viu nascer e criar: “A minha opinião sobre o bairro resume-se numa frase: é a capital de Lisboa”. E justifica o porquê: “Tem tudo. O ar puro de Monsanto, o ar fresco do Tejo e as ruas todas direitas. A convivência e a segurança são ótimas”.
Dono da florista, na família à três gerações, refere que conhece “a maioria da pessoas que residem em Campo de Ourique e gostam de viver aqui”. “A população do bairro está um pouco envelhecida, com muitos reformados. Quem vem para aqui tem poder económico, as casas aqui não são nada baratas”, afirma, defendendo que o bairro oferece todos os serviços que precisa e os que não existem “são relativamente perto”.
JUNTA PROMETE MAIS ESTACIONAMENTOS E QUER METRO ATÉ CAMPO DE OURIQUE
A Junta de Freguesia quer a expansão da linha vermelha do Metro de Lisboa até Campo de Ourique, afirma o presidente da Junta, Pedro Cegonho, em depoimento a Olhares de Lisboa, onde também reafirma que a EMEL vai abrir um parque com 245 lugares na Rua Correia Telles e a EMPARK vai libertar cerca de 120 lugares.
Olhares de Lisboa – Uma das críticas apontadas pelos moradores tem a ver com a falta de estacionamento.
A Junta de Freguesia em articulação com a Câmara está a tomar algumas medidas?
Pedro Cegonho – O estacionamento é para a Junta de Freguesia de Campo de Ourique um tema de maior preocupação. Temos trabalhado com a Câmara Municipal de Lisboa em duas vertentes:
1) procurar novas ofertas de estacionamento que desincentivem o uso de transporte individual. Para isso, antes de 2017, disponibilizámos o Pátio das Sedas, na Rua de Campo de Ourique, com 165 novos lugares. A EMEL vai também abrir um parque, na Rua Correia Teles, com 245 lugares, e a EMPARK, no Parque junto à Igreja do Santo Condestável, reduziu o número de veículos clássicos ali estacionados, tendo libertado cerca de 120 lugares;
2) procurar que a freguesia tenha melhor oferta de transportes públicos, em número de carreiras, horário e frequência. A título de exemplo, o horário do 709 foi alargado, em fins-de-semana e feriados, e a frota do 774 foi modernizada, aumentando a capacidade de passageiros. Temos acompanhado a exigência do município ao Metropolitano de Lisboa, com a expansão da linha vermelha até Campo de Ourique.
O preço das habitações está a afastar os moradores de Campo de Ourique: Quais as medidas a nível de habitação a preços controlados que estão a ser implementadas?
O problema da habituação é preocupante, mas, infelizmente, as políticas públicas que têm incidência nesse tema estão desenvolvidas aos níveis municipal e nacional. A esses níveis é de registar projetos quer do Município quer do Estado. Salientam-se os programas de apoio ao arrendamento habitacional, tanto do Município – Arrendamento Convencionado, Arrendamento Social RRAHM, PRA – Programa de Renda Acessível e Subsídio Municipal de Arrendamento – quer do próprio Estado – 1º Direito Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, Porta 65 Jovem, Arrendamento Acessível e Arrendamento Apoiado.
Ao nível da Junta de Freguesia de Campo de Ourique temos um Gabinete de Informação ao Cidadão onde, através de um jurista, encaminhamos casos de pedidos de ajuda – despejo de inquilinos em situação vulnerável, situações diversas de pessoas desfavorecidas, entre outros casos – para que as pessoas saibam como proceder e onde se devem dirigir, à Segurança Social ou ao Apoio do Fundo de Emergência Social, por exemplo.
Campo de Ourique está a atrair novos moradores, mais jovens. Existe alguma política que esteja a ser implementada para continuar a atrair mais população?
A Junta de Freguesia de Campo de Ourique planeou os objetivos sociais para a sua população com a criação e manutenção de serviços acessíveis a todos, pela proximidade com o público, pela diversidade, pelos encargos e pela humanidade: o Atendimento Social, o Fundo de Emergência Social, Fundo de Emergência da Freguesia, Programa Intervir, Ludobiblioteca, Passeio Cultural, Biblioteca Espaço Cultural Cinema Europa, Cabine de Leitura, Universidade Sénior, Praias-Campo Infância e Sénior e Férias Radicais e Juvenis nas P3 e/ou P4, entre outros.
São estes serviços, a par de outras atividades de dinamização da freguesia, que permitem atrair novos moradores, mais população.
Que apoios às famílias são facultados pela junta de freguesia?
Estamos a executar uma série de valências escolares de Atividades de Animação e Apoio à Família que permitem a animação de tempos livres das crianças através de atividades lúdico-pedagógicas, antes e depois do término das atividades letivas e durante as pausas curriculares.
Entre as várias atividades, temos oficinas de artes, ateliês de culinária, jogos desportivos, atividades de educação para a cidadania, e outras, asseguradas por equipas locais que lhes garantem um espaço educativo seguro e divertido.
Além destas atividades lúdicas, também o Pólo de Economia Circular de Campo de Ourique – PECCO, constitui uma forma de apoio às famílias na nossa freguesia. Com este projeto pretendemos promover a partilha, reparação e reutilização de bens de consumo, numa ação local de proximidade, através do Baú dos Brinquedos, que aumenta a vida útil dos mesmos e fomenta a partilha dos brinquedos, Closet Partilhado, que permite trocar peças de roupa, Loja Social, que se destina à atribuição de bens a munícipes que se encontrem em situação comprovada de vulnerabilidade Social, para além de outras valências, e outros serviços.
Que atividades culturais e de lazer vão ocorrer na freguesia até ao final do ano?Além das atividades recorrentes da programação da Biblioteca Espaço Cultural Cinema Europa, que divulgamos mensalmente, e dos regulares Passeios Culturais, existirão atividades que vão marcar o regresso às aulas e o período de Natal, como os concertos de Natal das Igrejas, teatro no auditório da Biblioteca, e outras. Teremos mais três exposições de marionetas, cartoons e fotografia, na Biblioteca Espaço Cultural Cinema Europa, até ao final do ano.