A Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a Associação 25 de Abril concluíram, este domingo, 24 de março, o projeto “Lugares de Abril”, que surgiu em 2019, como forma de recordar 25 locais que fizeram parte da Revolução de 25 de Abril de 1974.
O Largo do Carmo, a antiga Sede da PIDE/DGS, o Cais das Colunas, o Rossio e o Aeroporto de Lisboa são os cinco locais que agora que juntam à lista do projeto ‘Lugares de Abril’. Este, identifica, na cidade de Lisboa, os diversos locais associados à ação do Movimento das Forças Armadas (MFA) no dia 25 de Abril de 1974. Este projeto surgiu em 2019, a propósito das comemorações dos 45 anos da revolução e conta, no total, com 25 placas. Em breve, serão colocadas as duas placas em falta, no Quartel da Pontinha e no antigo edifício da Rádio Marconi, na Rua de São Julião, assim que terminarem as obras que estão a decorrer nestes locais.
A conclusão deste projeto está integrado nas comemorações municipais do 50.º aniversário do 25 de Abril. A inauguração das últimas placas contou com a presença do presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas, e do vice-presidente da Associação 25 de Abril, Aprígio Ramalho. De acordo com o último, numa intervenção que fez no Largo do Carmo, “este é um local absolutamente imprescindível” neste projeto, uma vez que foi aqui que “houve uma concentração popular” e a posterior rendição de Marcello Caetano. “Estou muito satisfeito por termos concluído este projeto”, referiu ainda Aprígio Ramalho, um dos capitães que comandou a revolução.
Repetir e contar a história da revolução
Já Carlos Moedas, salientou que este projeto “é importante porque conta a nossa história”. “São 25 lugares que contam a história da mudança do nosso país”, prosseguiu o autarca, lembrando a importância da Revolução dos Cravos para trazer a liberdade e a democracia para o país. “O que é importante na história é contá-la e repeti-la”, concluiu o presidente da CML, agradecendo a todos os militares que fizeram a revolução. Aos jornalistas, no final da inauguração, Moedas referiu ainda que “a democracia é sempre frágil e temos que a tratar como uma flor rara. Proteger a democracia é contar a nossa história, e este projeto dos 25 lugares de Abril é um projeto que faz isso”.
Cada uma das 25 placas conta com um QR Code, para onde as pessoas podem apontar o telemóvel, acedendo a um link que detalha a história daquele local no dia da revolução. “É muito importante repetirmos a nossa história, porque é a única maneira de defender a democracia”. Igualmente, Carlos Moedas falou ainda da importância de falar do 25 de Abril às gerações mais novas. “Temos que estar, hoje, cada vez mais unidos, sobretudo quando olhamos para o resultado das últimas eleições”, acrescentou ainda o presidente da autarquia lisboeta. “O populismo está a tornar-se um perigo para a nossa democracia”, sustentou. Na inauguração deste domingo, cada uma das placas inauguradas contou com uma pequena explicação, dada pelos ‘capitães’ que participaram e testemunham a revolução.
O fim de um regime de 48 anos
Um deles foi o Coronel António Rosado da Luz, que, à data, tinha 25 anos e cumpria serviço militar no Centro de Instrução de Artilharia Antiaérea de Costa de Cascais (CIAACC). “Tive uma ligação pessoal com o Salgueiro Maia, que entrou comigo na Academia Militar”, recordou o antigo capitão, que foi uma das figuras presentes no Largo do Carmo. “Nós tínhamos uma superioridade de forças inimigas à nossa volta”, lembrou, sublinhando que a rendição de Marcello Caetano “foi uma tarefa díficil”. “Houve uma tropa, que em princípio seria nossa, do Regimento de Infantaria Um, que chegou aqui e nos comunicou que estava do lado do inimigo”, prosseguiu o coronel na sua explicação.
“Tivemos que convencer as tropas restantes, a passarem para o nosso lado”, acrescentou ainda António Rosado da Luz, salientando que esta foi uma missão bem sucedida. Ao Olhares de Lisboa, referiu que o dia 25 de Abril de 1974 foi importante para o início da liberdade em Portugal. “A minha missão foi quase sempre estabelecer a ligação entre a direção e as estruturas que estávamos a criar, não nos podemos esquecer que era um movimento clandestino. Portanto, no dia 25 de abril, continuei estas missões, e as poucas comunicações que fazíamos por rádio eram codificadas, para que não o inimigo não soubesse onde é que estávamos e o que é que estávamos a fazer”, recordou o coronel, que contribuiu para acabar com o regime de ditadura que o país vivia há 48 anos.
Manter os valores de abril
Nesse período, lembrou, “tínhamos de esconder aquilo que se dizia, olhar para o lado e pensar que determinada pessoa podia ser da PIDE”. “O meu correio era aberto. Embora sendo militar do quadro permanente e uma força do regime, a PIDE foi ao meu quartel prender-me, porque me abriam a correspondência e liam a minha correspondência”, recordou António Rosado da Luz. O militar conta que, quando chegou à sede da PIDE, na Rua António Maria Cardoso, viu que “quase quatro milhões de pessoas, num universo de nove milhões de habitantes, tinham ficha na PIDE”.
“Haviam 3500 gavetas, e cada uma delas tinha mil fichas. Isto era um sistema absolutamente horroroso, hoje ninguém tem isso”, disse o coronel, que lamenta, nos dias de hoje, estar a assistir “a uma deriva para a direita e para a extrema direita”. “No meu entender, aquilo que está a acontecer é o fim de um sistema, de uma era histórica”, reforçou, sublinhando que as atuais gerações devem “cuidar” dos valores e ideais de abril, para “não os perder”. Também Alberto Ferreira, coronel de cavalaria e capitão de abril, mostrou-se preocupado com o futuro do país. “Não vejo como é que os meus netos vão estar, na sociedade que temos hoje”.
Sede da PIDE/DGS é outro dos locais assinalados
O coronel foi um dos militares que esteve na sede da PIDE, que na manhã de 25 de abril de 1974, foi cercada por populares e militares. Durante o cerco, por volta das 20h15, elementos da polícia do regime dispararam sobre a população, causando vários feridos e matando quatro pessoas, as únicas vítimas da revolução. “Eu cheguei, disseram que a PIDE/DGS tinha dado uns tiros, aproximei-me e disseram para subirmos e fomos receber a rendição do Major Silva Pais”, lembrou Alberto Ferreira, confessando que “achava que a PIDE/DGS era para continuar”. “Tínhamos muita experiência de combate, das guerras do Ultramar. Portanto, tínhamos a convicção de que teríamos de fazer as coisas sem tiros”, disse ainda o coronel.
Todo o roteiro dos ‘Lugares de Abril’, pode ser consultado no site da Associação 25 de Abril. Esta iniciativa está inserida na programação oficial do cinquentenário do 25 de Abril, promovida ao longo do ano de 2024 pela Câmara Municipal de Lisboa. “Lisboa foi um dos palcos principais da Revolução dos Cravos, e, por isso, a autarquia não podia deixar de comemorar, obviamente, de forma significativa”, esta data, referiu ao Olhares de Lisboa o vereador com o pelouro da Cultura da CML, Diogo Moura. “A Câmara Municipal decidiu encetar um conjunto de iniciativas, transversais a várias áreas, desde a música, a dança, as artes plásticas, as artes visuais”, entre outras. “Serão mais de uma centena de iniciativas”, frisou o autarca, lembrando que, “nos tempos conturbados que vivemos, mais é do que nunca é importante” a celebração dos 50 anos da revolução de abril.
Celebrar a liberdade através das artes
“O 25 de Abril trouxe-nos a liberdade, a democracia, trouxe-nos o facto de podermos votar, de sermos livres e fazer as nossas escolhas”, frisou. “Muitas vezes as pessoas não têm noção daquilo que os nossos antepassados viveram, que há décadas atrás lutaram para termos um país livre”, acrescentou Diogo Moura, reforçando que “a liberdade é um dos maiores valores que podemos ter”. ”Estas comemorações querem, não só recordar momentos históricos, mas também representá-los” através das artes e da cultura. Para esta segunda-feira, 25 de março, está marcada a inauguração da escultura ‘Memorial Vigília Da Capela do Rato’, às 18h30, no Jardim das Amoreiras.
Este trabalho, da autoria da artista plástica Cristina Ataíde, homenageia a vigília de protesto de um grupo de católicos progressistas que, no dia 30 e 31 de dezembro de 1972, se reuniram na Capela do Rato. O coletivo assumiu, assim, uma posição contra a Guerra Colonial e a ditadura do Estado Novo. Nesta inauguração, estarão o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas, e o vereador da Cultura, Diogo Moura. Igualmente, também estarão a presidente da Comissão Comemorativa dos 50 Anos do 25 de Abril, Maria Inácia Rezola, a artista plástica Cristina Ataíde e o presidente da Junta de Freguesia de Santo António, Vasco Morgado.