Costa da Caparica: uma década de progresso

José Ricardo Martins é presidente da Junta de Freguesia da Costa da Caparica. A terminar o seu terceiro mandato, o autarca salienta que não se revê numa candidatura à Câmara Municipal de Almada. Sobre o desenvolvimento da freguesia, garante que a Costa da Caparica melhorou muito em termos de investimento e desenvolvimento nos últimos 10 anos. Embora, defenda, que a falta de habitação e de agentes das forças de segurança continuem a ser, atualmente, alguns dos pontos fracos da freguesia, que recebe, na época estival, “cerca de um milhão de pessoas no fim-de-semana”.

A Junta de Freguesia da Costa da Caparica tem 22 mil habitantes, mas, em agosto, durante um fim-de-semana, há “cerca de um milhão de pessoas a visitar a Costa da Caparica”, afirma o presidente da junta, José Ricardo Martins, em entrevista a Olhares de Lisboa.

Esta pressão traz problemas ao nível da mobilidade e estacionamento na freguesia. “Mas, há um novo regulamento da WeMob, que pretende dar maior proteção aos moradores, e que entrou em vigor no dia 15 de julho. Vamos ver se, realmente, consegue organizar o estacionamento na Costa da Caparica”. Estas limitações, na perspetiva do autarca, têm a ver “com o crescimento” demográfico da freguesia.

“As infraestruturas de mobilidade e outras do subsolo, não acompanharam essa evolução”, lamenta José Ricardo Martins. “Existem duas fases completamente diferentes: uma foi em 1966, transversal a todo o país, em que houve uma migração do interior para o litoral, onde a Costa também não fugiu a essa migração; e depois um outro período, nos anos 80 e 90, com a construção, digamos, excessiva”, prosseguiu o presidente, defendendo que a construção massiva, apesar de essencial, contribuiu para as “alterações climatéricas, a impermeabilização do solo num território super frágil”, entre outras questões.

Apesar de reconhecer que a Câmara Municipal de Almada tem realizado obras importantes na freguesia, José Ricardo Martins pede uma maior intervenção na rede de abastecimento de água, dadas as frequentes quebras na distribuição.

Melhorar infraestruturas locais

“Este executivo ou o outro que vier tem obrigatoriamente de investir no melhoramento do abastecimento de água”, afirma, lembrando que a pressão turística sobre algumas zonas das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, a isso o obriga.

“E por isso, Portugal vai ter de perceber como é que vai gerir a pressão turística, tanto na mobilidade como nos resíduos, no lixo e na habitação, sem matar a ‘galinha dos ovos de ouro’ que é o turismo”, refere o autarca, salientando, contudo, que esta “simbiose vai ser muito difícil, porque a pressão começa a ser exageradamente alta para os moradores e, a médio prazo, pode prejudicar aquilo que é o funcionamento normal da vida dos moradores”.

Sem nunca esquecer a necessidade de melhorar a qualidade de vida dos habitantes, José Ricardo recorda que a Costa da Caparica está a passar por um conjunto de intervenções que prometem melhorar a mobilidade, nomeadamente as intervenções no IC20, com a construção de uma nova variante que irá melhorar o acesso à Torre das Argolas, de forma a aliviar o trânsito local.

Centro de Enfermagem Queijas

A nova variante, sublinha José Ricardo Martins, vai servir áreas habitacionais, nomeadamente os fogos que vão ser edificados no âmbito do PRR e novo centro de saúde, permitindo também “uma entrada mais rápida na Costa da Caparica, principalmente na época do verão”.

A Costa da Caparica tem sido alvo de diversas obras, designadamente o alargamento do IC 20, à saída da Ponte 25 de Abril, que deverá estar concluído até 2026.

Habitação e saúde

A habitação e a saúde são outras das preocupações da edilidade e, segundo José Ricardo, está previsto a “construção de 174 fogos de habitação” a custos acessíveis e de um novo centro de saúde”, que deverá ficar concluído até 2030. “Temos um grave problema de habitação na Costa da Caparica.  Todos os dias somos confrontados” com este problema questões, refere o autarca.

O atual centro de saúde, que passou a Unidade de Saúde Familiar (USF) tipo A em 2014, serve “mais de 20 mil utentes, da Costa da Caparica e da Trafaria”, não têm condições de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida, dado estar instalada na antiga Casa dos Pescadores, que é da Segurança Social.

Em termos de profissionais de saúde, José Ricardo Martins considera que esta infraestrutura tem os recursos humanos necessários para dar resposta à população, sendo que “o maior problema é mesmo a infraestrutura, que está desadequada àquilo que foi o crescimento da freguesia, da população e até do próprio Centro de Saúde. Nós passámos a USF em 2014 e a partir daí temos crescido”, sustenta.

Ação Social

No âmbito da Ação Social, a Junta da Costa da Caparica tem apostado nesta área, com destaque para o trabalho realizado pelo Centro Paroquial Nossa Senhora da Conceição que, desde 2016, tem apoiado famílias em situação de vulnerabilidade. Durante a pandemia da Covid-19, o centro teve um papel fundamental, embora as necessidades da população continuem a ser uma preocupação. “O Centro Paroquial foi o nosso principal parceiro durante a pandemia. Nós apoiámos 6012 famílias com alimentação, mas também demos apoio com as fotocópias dos manuais escolares, a entrega de computadores, desde spots de internet”, o que faz com que a Junta da Costa da Caparica tenha apoiado mais de sete mil famílias.

Sobre o período da Covid-19, o presidente da Junta da Costa da Caparica destacou o papel importante “de algumas instituições” e entidades particulares. “Havia um decreto-lei que dizia que as pessoas não poderiam utilizar os parques de campismo, quando nós sabíamos que aí havia alguns moradores. No total, existiam 326 moradores nos parques de campismo da freguesia.

Muitas fragilidades

“Temos um território frágil em três situações: o avanço do mar, a erosão da arriba e um território propício a cheias rápidas”, disse o presidente, lembrando que, no final de 2023, houve “alguns desmoronamentos da arriba e tivemos de evacuar as seis famílias na zona de Santo António. Tivemos o IC 20 cortado”, devido a este acontecimento.

“A arriba é uma preocupação e a construção clandestina perto da arriba é outra preocupação”. Para proteger a costa da erosão causada pelo avanço do mar, há, a cada cinco anos, um enchimento das praias com areia. O próximo enchimento está previsto para 2025.

“A Costa da Caparica é a praia que mais dinheiro tem gastado ao Estado em enchimento. O objetivo deste enchimento é proteger as pessoas e bens, tentar mitigar a energia do mar e criar uma barreira, porque a areia é a barreira natural do avanço do mar”.

Desde 2019, ressalva, “perdemos 40% daquilo que foi depositado, e em praia submersa 20%, o que quer dizer que a própria natureza está a reestruturar aquilo que é a praia. Porque o objetivo dos enchimentos é reestruturar a praia através de uma saturação do sistema. E isso penso que está a ser conseguido, o que é uma grande mais-valia”.

Programa Pólis

Ligado também, de certa forma, às questões ambientais estava o antigo programa Pólis, lançado como um plano estratégico para o desenvolvimento sustentável da Costa da Caparica, e que gerou diversas controvérsias.

“Tenho de dizer que o Pólis foi, até à data, o único plano de desenvolvimento estratégico que tivemos na Costa da Caparica”, sublinhou José Ricardo Martins, lembrando que parte deste programa “estava sustentado num sistema de autofinanciamento”, cuja verba serviria para construir um novo Plano Pormenor.

O Pólis tinha como objetivo a requalificação da Costa de Caparica em termos ambientais e urbanísticos. Contudo, “os dois únicos Planos de Pormenor que realmente foram para a frente, dos sete previstos, foram o Jardim Urbano e o Plano Pormenor das praias urbanas”, recorda José Ricardo Martins.”

A valorização da Costa da Caparica enquanto destino turístico é outro dos objetivos do Pólis, com a recuperação dunar, a criação de novos acessos às praias, a melhoria do Transpraia, a disponibilização de terrenos para a construção de unidades hoteleiras e a construção de novos apoios de praia. Os transportes e as acessibilidades são também outras áreas de intervenção do Polis, incluindo a criação de uma rede de ciclovias, novos percursos pedonais, reserva de espaço para o Metro Sul do Tejo, sistema de gestão do estacionamento, novos parques para automóveis e o prolongamento do IC20 para sul como investimento complementar.

Transpraia pode ser reativado

Outro projeto previsto é o regresso do Transpraia, um pequeno comboio que ligava todas as praias da Costa da Caparica, e que foi deslocalizado do centro da cidade, devido ao Pólis.

“Estava prevista uma nova centralidade na zona do Campo da Bola, até a sede da junta de freguesia ia para lá. Daí, o Transpraia passou para perto da Praia da Saúde”, sendo que, esta deslocalização, a par com os preços excessivos das viagens e a pandemia, ditaram o fim deste transporte. “O Transpraia, como está agora, não é viável por várias situações. A primeira é a situação ambiental. Em 1966, quando surgiu o Transpraia, não havia, a preocupação com a proteção das dunas e do ambiente.

O Transpraia está sob uma duna primária e é movido a gasóleo, que é um poluente”, refere José Ricardo Martins, que “gostaria que o Transpraia fosse reativado”, mas num modelo que pudesse também servir como meio de transporte dentro da freguesia. Ainda na matéria da mobilidade, José Ricardo Martins defende “o Metro Transportes do Sul (MTS) até à Costa porque estamos a precisar de retirar carros da cidade, por causa dos aspetos ambientais, por causa da subida de temperatura, das ondas de calor, do dióxido de carbono. E o Metro pode e deve servir grande parte das pessoas que nos visitam”, refere o presidente, salientando que o atual traçado “vai desventrar a Avenida Afonso de Albuquerque, se calhar vamos perder um espaço verde, mas temos que arranjar outro”.

Segurança e Cultura

Outro ponto crítico abordado foi a falta de agentes das forças de segurança na Costa da Caparica. “A Costa da Caparica é um local seguro, sempre foi, eu estive no Conselho Municipal de Segurança na parte da criminalidade, naquela altura em que diziam que na Costa da Caparica havia isto, havia aquilo, mas os números não correspondem àquilo que as pessoas dizem. Agora, efetivamente, nós temos falta de militares. Os militares da GNR não chegam para as situações e no verão, então é praticamente impossível. Acresce que durante o verão, a Costa da Caparica é reforçada com aquele protocolo que o Governo português faz com Espanha e Itália, o Turismo Seguro. Este ano, por azar, os italianos não vieram, só os espanhóis. Ou seja, é mais uma lacuna”, critica José Ricardo Martins.

Atualmente, existem cerca de 30 efetivos ao serviço da GNR na Costa da Caparica. “É muito insuficiente, principalmente no verão. Eu volto a dizer que nós, num fim de semana de Agosto, recebemos um milhão de pessoas. Nós não estamos a falar de criminalidade, nós estamos a falar de prevenção da criminalidade”.

Por outro lado, no âmbito da Cultura, o autarca refere o Festival Sol da Caparica, atualmente um dos maiores eventos culturais da região, como um evento fundamental para a freguesia, uma vez que trouxe grandes benefícios, tais como a promoção da cultura portuguesa e a revitalização da imagem da Costa da Caparica. No entanto, a realização deste evento coloca uma elevada pressão na localidade, especialmente em termos de estacionamento e transportes.

“Se retirarem o Sol da Caparica da Costa, deixa de ser o Sol da Caparica”

“O Sol da Caparica apareceu numa altura em que a freguesia tinha uma imagem completamente deteriorada, associada à criminalidade”, recordou o autarca, destacando o papel fundamental de António Manuel Guimarães, o promotor das primeiras edições do Sol da Caparica, no sucesso deste evento. “O António Manuel Guimarães, no meu ponto de vista, teve uma visão extraordinária, que foi a de criar um festival só de música portuguesa”.

No entanto, reconheceu, que após a saída deste promotor e a entrada do Grupo Chiado (que organizou o festival até 2023), “ninguém quis agarrar no Sol da Caparica”. “Este ano foi um novo promotor [o consórcio Domingo no Mundo e Music Mov], e vamos aguardar para ver”. Sobre a falta de estacionamento e elevada pressão na Costa devido à realização do festival, José Martins realça que “se localizarem o Sol da Caparica fora da Costa da Caparica, deixa de ser o Sol da Caparica”, pelo que defende a continuidade do festival nesta localidade.

O futuro de José Ricardo na vida política

José Ricardo Martins foi eleito como presidente da Costa da Caparica em 2013, tendo sido reeleito em 2017 e 2021. Por limitação de mandatos, este será o terceiro e último mandato à frente da Junta da Costa da Caparica. Atualmente, o autarca está como independente, após ter sido militante do Partido Socialista durante 30 anos. “Saí por causa da saturação com as decisões do partido”, referiu o autarca, sem se quer alongar mais. Durante o último ano de mandato, José Martins adianta que gostaria de concretizar “muita coisa”.

Apesar de não se poder candidatar mais à Junta da Costa da Caparica, José Ricardo Martins não vê, por enquanto, candidatar-se à Câmara Municipal de Almada como vereador.

“Tenho algumas coisas bem vincadas que têm a ver com os meus valores. Se puder ser útil, irei ajudar as pessoas mais carenciadas pro bono, obviamente”, afiança, acrescentando: “quem sabe, apoiar uma associação, um clube, o que quer que seja. Irei estar atento a tudo aquilo que diz respeito à Costa da Caparica. Já o fazia antes de pensar em vir a ser o que quer que fosse, irei ser uma voz ativa naquilo que tem a ver com o desenvolvimento futuro da Costa da Caparica e uma coisa eu sei, a Costa da Caparica não tem muito mais para onde crescer”.

O presidente da Junta realça que “em política, um ano é uma eternidade”, pelo que não consegue afirmar se a autarquia se irá manter nas mãos do Partido Socialista.

Sobre a relação que tem com a Câmara de Almada, José Ricardo Martins refere “que esteve em dois contextos”. Ou seja, “um em que a Câmara e as juntas eram de um ou outro partido, e agora com a presidente Inês de Medeiros, onde apenas o Laranjeiro não é da mesma cor da Câmara Municipal”. “Não tenho razão de queixa do trabalho que foi desenvolvido com o presidente Joaquim Judas (autarca eleito pela CDU entre os anos de 2013 e 2017) e criámos aqui uma cumplicidade de trabalho e de amizade”.

Nr: Noticia atualizada pelas 16h 09 de 13/9/2024

 

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