A vitória de Carlos Moedas, nas últimas eleições autárquicas, motivada pela perda de mais de vinte mil votos de Fernando Medina, abriu um novo ciclo político na cidade que coloca em risco algumas das conquistas – muitas delas limitadas, é certo – que as pessoas foram obtendo ao longo destes anos.
Sabemos como a governação do PS, com António Costa e Fernando Medina, foi limitada nas questões centrais da cidade. Na habitação, houve sempre o entendimento de que os interesses dos fundos imobiliários, dos grandes proprietários, dos vistos gold e da turistificação da cidade eram compatíveis com as necessidades de quem vive e trabalha em Lisboa. Não eram. As pessoas foram expulsas da cidade e, à exceção de uma elite, quem cá vive sofre todos os meses para cumprir o pagamento da renda. Na mobilidade, apesar de algum investimento em mobilidade suave e nos transportes públicos, o caminho foi também insuficiente; ora porque se demorou mais do que era necessário (como foi o caso da rede GIRA ou da melhoria do serviço da CARRIS), ora porque se insistiu em medidas erradas (como é o caso da linha circular do metro), ora porque faltaram medidas essenciais como a implementação da Zonas de Emissão Reduzidas (ZER) que fazem falta a uma cidade que quer levar a sério as alterações climáticas e que, para isso, precisa de abandonar o automóvel.
Como disse, sabemos de tudo isto. Mas sabemos também que nenhum destes problemas centrais se resolve com a direita. Na verdade, o programa de Carlos Moedas representa um recuo face aos limitados avanços da governação do PS. Na habitação, Moedas apresentou um deserto de ideias, defendendo apenas uma borla fiscal para os mais ricos; na mobilidade, apresentou-se como o defensor do automóvel, prometendo baixar os preços da emel e destruir as ciclovias.
Aqui chegados, temos de reconhecer o óbvio: há uma alteração de ciclo político, mas Carlos Moedas terá de governar a cidade com uma maioria de esquerda na Câmara e na Assembleia Municipal. A esta maioria exige-se clareza. É isso que as pessoas que vivem e trabalham na cidade exigem. Que não haja recuos em conquistas que demoraram anos a conseguir.
São essas pessoas que, já no dia 19 de outubro, estarão a lutar por mais e melhores ciclovias na cidade, não pela destruição das que existem. A esquerda, a maioria de esquerda, tem de estar ao lado destas pessoas, e não da ACP ou dos fundos imobiliários, os tais que se assumem como os donos da cidade. Essa é a clareza que se exige. Ninguém entenderá que argumentos de governabilidade ou de real politik comprometam avanços que melhoraram a cidade. O sinal que as pessoas que vão sair, de bicicleta, no dia 19 é o exemplo a seguir: se não queremos passos atrás, juntemos forças para proteger a cidade.
O Bloco assume esse compromisso e não faltará às suas responsabilidades. Mais do que formulações vazias, do estilo “votaremos o que for bom para a cidade e contra o que for mau”, estamos prontos para nos comprometermos com questões concretas. No que depender de nós, a habitação pública, a mobilidade suave, o investimento em transportes públicos de qualidade e em ciclovias vieram para ficar.
Vasco Barata
Deputado Municipal do Bloco de Esquerda eleito nas eleições de 26 de setembro de 2021.
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