A Câmara de Lisboa aprovou esta sexta-feira a primeira Carta Municipal de Habitação, proposta pelo executivo municipal PSD/CDS-PP e que acolheu alterações de PS, BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa, prevendo um investimento de 900 milhões de euros nos próximos 10 anos.
Com os votos a favor da coligação “Novos Tempos” (PSD/CDS-PP/MPT/PPM/Aliança), que governa sem maioria absoluta, e a abstenção de PS e PCP, a Câmara Municipal de Lisboa aprovou esta sexta-feira a Carta Municipal de Habitação de Lisboa, que estabelece um ambicioso compromisso político para aumentar a oferta de habitação na cidade e inaugura uma década de forte investimento na política de habitação.
Os socialistas e os comunistas, que se abstiveram, consideram que carta é um “flop” e os Cidadãos por Lisboa pedem uma carta eficaz, que garanta o direito à habitação – o pilar da função social do setor não parece a prioridade dos Novos Tempos.
“Alcançou-se um compromisso político histórico para investir mais de 900 milhões de euros em habitação, permitindo construir 3000 novas casas públicas até 2028, urbanizar terrenos públicos parados, como o Casal do Pinto e o Vale de Santo António, e destinar terrenos com capacidade para 500 casas em cooperativa, entre outras medidas essenciais para concretizar as prioridades ambiciosas estabelecidas pelos Novos Tempos: aumentar e melhorar a oferta de habitação pública, reduzir as assimetrias no acesso à habitação e regenerar a cidade esquecida”, sublinha o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas.
Renovação dos bairros municipais
“Com a aprovação deste documento estratégico a cidade de Lisboa fica dotada de uma política de habitação audaciosa para os próximos 10 anos, que inclui a reabilitação de habitações vazias e lança uma onda de renovação dos bairros municipais, dotando-os de condições habitacionais e energéticas nunca antes garantidas”, afirma por sua vez a vereadora da Habitação e Obras Municipais, Filipa Roseta.
Além da oferta de habitação pública, a Carta Municipal de Habitação de Lisboa lança as bases de um sistema assente nos pilares privado e em parceria para a oferta de habitação acessível.
“Mapeámos um potencial de construção de 7400 casas, das quais 3000 com investimento totalmente público. Iremos disponibilizar as restantes 4000 potenciais a parceiros de construção”, destaca Filipa Roseta, sublinhando a necessidade de se “aumentar significativamente o número de casas acessíveis em Lisboa aproveitando esta oportunidade”.
Neste âmbito, está já em curso o programa Cooperativas 1ª Habitação Lisboa, com um concurso aberto para a construção de habitação em cooperativa na freguesia do Lumiar.
“Agora temos todas as condições para fazer um verdadeiro choque de oferta de habitação, pondo toda a propriedade municipal com capacidade habitacional a uso, ao serviço das pessoas e das famílias”, afirma a autarca.
“Saúdo o compromisso alcançado, fundamental para assegurar a concretização das 35 medidas aprovadas. É uma excelente forma de celebrarmos os 50 anos do 25 de abril”, conclui Filipa Roseta.
O documento agora aprovado será ainda submetido a votação em Assembleia Municipal de Lisboa.
Oposição contra Carta Municipal de Habitação
A oposição na Câmara de Lisboa criticou a proposta de Carta Municipal de Habitação, considerando que fica aquém das carências habitacionais existentes na cidade. Apesar de terem viabilizado a proposta ao se absterem, PS e PCP partilham das preocupações manifestadas por BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa (eleitos pela coligação PS/Livre) — que votaram contra — sobre a Carta Municipal de Habitação, que prevê um investimento de 900 milhões de euros nos próximos 10 anos para aumentar a oferta de habitação na cidade.
A primeira Carta Municipal de Habitação de Lisboa (CMHL) acolheu alterações de PS, BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa, no âmbito da reunião privada do executivo camarário.
Destacando a incorporação das suas propostas de “mais regulação para o alojamento local, repondo o teto máximo de 5% na cidade”, uma quota de até 25% do total de fogos destinada a renda acessível e a antecipação para 2024/2025 de projetos para renda acessível no Restelo, Benfica, Ajuda e Parque das Nações, a vereação do PS considerou que a CMHL é “um ‘flop’”, registando “sérias divergências” com o documento por existirem “falhas e omissões que não foram corrigidas”, como a revisão do Plano Diretor Municipal (PDM), a identificação da “verdadeira carência habitacional da cidade” e a apresentação de números “pouco rigorosos e fiáveis”.
“Apesar do nome, o documento não configura uma verdadeira Carta da Habitação, uma vez que olha apenas para a habitação municipal e ignora o potencial de construção quer em terrenos do Estado, quer por privados, não o tentando sequer mobilizar através de incentivos e benefícios fiscais”, apontou o PS, referindo que a CMHL também “não identifica a verdadeira carência habitacional da cidade, considerando que cerca de 10 mil casas (o número de candidatos a programas municipais de habitação) resolvem a carência de habitação em Lisboa”.
PCP não encerra debate
Também o PCP considerou que a CMHL tem um programa de ação que no campo da produção de habitação “fica aquém do nível de carências que a cidade manifesta” e quanto à mobilização do solo com potencial habitacional “deixa em branco o que fazer com o património público do Estado”, além de que “mantém fora do quadro de intervenção o grave e volumoso problema dos 48.000 fogos vagos e devolutos”.
Em comunicado, os comunistas referem que o documento prevê na construção e recuperação de casas “um programa de ação que, embora insuficiente, supera significativamente o histórico recente de atuação municipal, ainda que muito sustentado pelo financiamento PRR [Plano de Recuperação e Resiliência]”, ressalvando que a CMHL não encerra o debate sobre política de habitação na cidade de Lisboa.
BE pede renda acessível
O BE justificou o voto contra a Carta Municipal da Habitação por ter sido rejeitada a sua proposta de pôr fim aos programas de arrendamento acessível em regime de parceria público-privada (PPP), destacando a aprovação de um rácio máximo de 5% de alojamento local, que “não deve haver mais hotéis enquanto não existir um estudo de carga turística e a garantia de casas para o Programa de Renda Acessível 100% público com o uso do zonamento inclusivo”.
Os bloquistas recordam que “em nove anos ainda não há uma única casa do pilar PPP” e que todas as casas de renda acessível que o presidente da câmara, Carlos Moedas (PSD), entregou vêm do pilar 100% público que o BE impôs ao PS no mandato anterior, sublinhando que, com a aprovação da CMHL, a liderança PSD/CDS-PP “deixa de ter desculpas para poder começar a produzir habitação pública para a cidade”.
Livre fala de emergência
Para o partido Livre, “esta não é a Carta Municipal de Habitação de que Lisboa precisa para fazer face à emergência habitacional”, porque as medidas apresentadas não incidem sobre os territórios da cidade identificados como sendo aqueles em que a crise da habitação se acentua, “devido a pressões especulativas e turísticas”.
Entre as propostas acolhidas no documento, o Livre destacou a criação de um índice de pressão turística no âmbito da elaboração do estudo da capacidade de carga turística de Lisboa, para funcionar a diferentes escalas (bairro/zona, freguesia e cidade) e que será uma ferramenta de monitorização constante de gestão da oferta turística e do condicionamento futuro das operações urbanísticas de uso turístico e regulação do alojamento local.
Cidadãos Por Lisboa (CPL, eleitos pela coligação PS/Livre)
Os vereadores dos Cidadãos Por Lisboa (CPL, eleitos pela coligação PS/Livre) consideraram que a CMHL é “vazia de soluções e de ambição na resolução da maior carência sentida pela população”, referindo que propôs caminhos para “promover a habitação, evitar o crescimento descontrolado de hotéis e alojamento local e usar mecanismos no PDM para evitar o desvio de casas para usos turísticos”, mas essas propostas foram rejeitadas.
Os CPL acusam ainda a liderança de Carlos Moedas de não lutar contra os efeitos do turismo, não promover a função habitacional diante do “desvio contínuo de casas” para outros usos e não identificar terrenos disponíveis além dos municipais, nem apontar soluções para os devolutos.