Gares Marítimas de Alcântara vão receber centro interpretativo de Almada Negreiros

O Porto de Lisboa, juntamente com a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a Associação do Turismo de Lisboa (ATL), assinaram, esta segunda-feira, 8 de julho, um contrato para a criação do Centro Interpretativo dos Murais de Almada nas Gares Marítimas, em Alcântara.

Foi assinado, esta segunda-feira, 8 de julho, o acordo entre a Administração do Porto de Lisboa (APL), a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a Associação de Turismo de Lisboa (ATL), a fim de criar o ‘Centro Interpretativo dos Murais de Almada nas Gares Marítimas’. Este espaço, localizado na Gare Marítima de Alcântara, pretende ser um polo cultural e turístico, de forma a promover a compreensão e a valorização de uma das mais importantes obras do modernismo português do século XX. Na cerimónia de assinatura do protocolo, esteve presente o presidente da CML, Carlos Moedas, que começou por referir que “hoje é um dia muito importante para Lisboa e um grande dia para a nossa cultura. Vamos ter estes 14 painéis de Almada Negreiros, que são os maiores murais do século XX em Portugal”.

O autarca agradeceu a todos os que tornaram esta requalificação possível, e que tiveram “a audácia de pensar mais além e olhar para este enorme património cultural que se expõe aqui nas Gares Marítimas”. “O que nós queremos é dar mais à cidade”, lembrou ainda o autarca, sublinhando que um dos objetivos é “reafirmar a dimensão de Lisboa como grande cais da Europa e esta visão de Lisboa como capital de entrar e de sair, neste Porto de Lisboa, que tanto recebeu e que tanto deu ao mundo”, disse ainda Moedas, acrescentando que a “visão” que se pretende para a cidade “é de uma cidade aberta a todos, tolerante e que respeita tudo e todos”, ligando “o turismo à cultura”.

Aqui, e dirigindo-se à Ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, Carlos Moedas referiu que “o turismo tem que ser cultura e tem que contribuir para ela”. Por isso, lembrou a intenção da CML em aumentar a taxa turística de dois para quatro euros.

Criar novas centralidades

“A ideia deste aumento é, de certa forma, contribuir, mas também ligar os turistas à cidade. Porque se a cidade vir o valor do turismo, seja em maior limpeza, em melhores espaços públicos, mas também mais cultura, então o turismo vale mesmo a pena e ele torna-se visível”. “São os turistas que estão a pagar para Lisboa, os lisboetas e os portugueses terem mais cultura. Hoje, o turismo são mais de 20% da economia de Lisboa e 25% do nosso emprego. Eu defenderei sempre o turismo, mas um turismo que se liga à cidade”, disse o presidente, lembrando que a abertura deste centro interpretativo de Almada Negreiros “é um passo fundamental” para esta ligação.

“As histórias do artista cruzam-se também com a minha vida, com o facto de ter conhecido a minha amiga Rita Almada Negreiros em Paris há tantos anos”, lembrou Moedas, recordando que o pintor tinha a intenção de criar, em Lisboa, um “cais que parte para o mundo”. “Almada foi sempre isso: um artista inovador que viu para além do seu tempo. E é isso que nós temos que voltar a ter em Lisboa, essa vanguarda cultural da Europa. Almada foi quem, contra muitos, procurou novas formas de fazer arte, de escrever e de pensar. Foi quem melhor combinou o movimento modernista, o seu vanguardismo, as suas formas tão geométricas, aquele ímpeto futurista com a tradição e a história. E isto é a definição de inovação”.

Um símbolo do século XX

Por isso, considera ainda o presidente, é fundamental “honrar a nossa história e ligar a história ao futuro. E quando fazemos esta ligação, há magia e essa magia é a inovação”. Para Moedas, Almada Negreiros foi “um símbolo do século XX, e que conta a nossa história como mais ninguém”. No total, serão restaurados seis painéis pintados pelo artista, e onde se podem ver representações de “Lisboa, dos mastos, das chaminés, dos marinheiros e das varinas”, ou seja, “da epopeia marítima” que retrata a “Lisboa humilde” do século XX.

“Era isso que Almada queria retratar e que o Estado Novo não queria mostrar e foi tão atacado e prejudicado”. Para o autarca, estes painéis “mostram a verdadeira realidade de Lisboa”, que, para além de “crítica social”, “mostra exatamente que são sempre as pessoas, aquelas tantas vezes esquecidas, que mudam o país. Esta é uma obra do povo de Lisboa”. Por fim, Moedas disse ainda que a abertura deste centro interpretativo serve para “transformar as nossas gares marítimas num pólo cultural, para fazer do Porto de Lisboa mais do que um terminal”.


35 mil turistas diariamente em Lisboa

“Com este memorando, as nossas gares marítimas tornam-se espaços de pessoas e para as pessoas que renovam a frente ribeirinha, e criam um pólo cultural que vai de Alcântara a Belém. E é também assim que vejo o futuro da nossa cidade, uma cultura com uma cidade que abre essa cultura às pessoas”. Aos jornalistas, Moedas afirmou que “é um dia histórico e importante para Lisboa, porque demonstra a ligação entre a cultura e o turismo. Este centro interpretativo de Almada Negreiros tem o custo de três milhões de euros, financiados pela taxa turística. Os maiores murais da Europa estão aqui construídos, e a abertura deste centro significa a abertura de Lisboa aos outros”.

“Quando digo que quero aumentar a taxa turística, é para criar mais cultura e maior limpeza na cidade”, disse o presidente, salientando que é ainda intenção da CML “criar novas centralidades”, algo que está a ser feito em parceria com o Turismo de Lisboa.

“Temos 35 mil turistas que entram em Lisboa e que, normalmente, vão para os mesmos sítios”, sustentou o autarca, lembrando que estas novas atrações são criadas com a taxa turística e não com o aumento da carga fiscal aplicada aos lisboetas. “Mas, mais importante do que isso, é toda a parte dos espaços verdes e da limpeza da cidade, porque há cada vez mais turistas e por isso, há mais sujidade na cidade, e portanto, é preciso mais dinheiro para essa limpeza”, reforçou ainda Moedas, lembrando que foi o seu executivo que aplicou a taxa turística aos passageiros dos navios de cruzeiro.

Taxa turística contribui para criar mais equipamentos culturais

Desta forma, foi possível igualar estes viajantes aos que chegam à capital portuguesa por via terrestre ou áerea. “Vamos deixar a cidade com mais equipamentos culturais, e estamos agora a decidir quais. O aumento da taxa turística ajuda a baixar os impostos dos lisboetas”, disse ainda o presidente, ressalvando que é seu objetivo terminar o seu mandato com uma redução de “cinco por cento” no IRS pago pelos lisboetas. “O turismo é muito importante, são quase 20% da nossa economia e 25% do nosso emprego. Não queremos diminuir o turismo, e temos que apostar noutras áreas, como a inovação e a cultura”, concluiu.

Por sua vez, o Ministro da Habitação e das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, disse ainda, na sua intervenção, que “estamos aqui para celebrar a arte, mas também para evocar o nome maior da pintura portuguesa do século XX: Almada Negreiros, que imortalizou Lisboa nos seus magníficos painéis, que irão ser devolvidos à cidade num processo faseado, por etapas, mas já iniciado. Os lisboetas merecem vê-los, mas merecem vê-los sempre que quiserem, assim como os turistas. Estes painéis são a expressão máxima do modernismo português”. “Como ministro das Infraestruturas, orgulho-me do restauro já em curso, num edifício tão emblemático de Lisboa como é este e que foi testemunha de tantos momentos da nossa história contemporânea.

Restauro dos murais deve estar concluído em 2025

“Se virmos as obras de Almada com atenção, verificamos que também prestam homenagem às infraestruturas, sem as quais, esta cidade não teria sido o que foi e o que é ainda hoje. É absolutamente indispensável termos essa consciência daquilo que foi o nosso legado, pois um povo sem passado é um povo sem futuro”, disse ainda Miguel Pinto Luz, adiantando que os trabalhos de restauro e conservação dos murais já se iniciaram e devem “estar concluídos no primeiro semestre do próximo ano”.

De acordo com o ministro, este centro interpretativo destina-se “a quem aqui vive e a quem nos visita, tendo sobretudo em atenção as comunidades escolares e universitárias. São intervenções estruturais que há muito se impunham e se tornaram possíveis com a compartipação financeira da World Monuments Fund (WMF), especificamente para o restauro dos Murais de Almada Negreiros, num contexto mais abrangente de modernização dos serviços portuários e respectiva envolvente”. No entanto, esta modernização, considera ainda o governante, “deve mobilizar todos, desde o Porto de Lisboa, o Ministério das Infraestruturas, o Ministério da Cultura, a Câmara de Lisboa, a APL, os cidadãos e os nossos co-cidadãos”.

Estreitar parcerias entre o Porto de Lisboa e as autarquias

“Este Governo prossegue e desenvolve trabalhos que vinham de trás. As bandeiras partidárias devem esbater-se quando estamos a falar do interesse comum e aqui é precisamente o interesse comum que estamos a falar. Aquilo que foi bem feito deve continuar e deve ser incentivada a sua persecução”, disse Miguel Pinto Luz, reforçando a necessidade de estreitar relações com a APL “para acelerar, ainda mais, esta relação com a CML. Devemos entregar, a quem sabe gerir a cidade, aquilo que lhe compete, e a quem sabe gerir portos e infraestruturas portuárias, aquilo que lhe compete”.

“Sabemos que o Porto de Lisboa o tem feito, mas outros portos não o têm feito de forma tão acelerada, e é importante que assim seja, porque, desta forma, mais rapidamente teremos iniciativas destas a funcionar”, justificou. Por fim, Miguel Pinto Luz lembrou ainda que, do outro lado do Tejo, em parceria com os Secretários de Estado das Infraestruturas e da Habitação, está a desenvolver o projeto do Arco Ribeirinho do Sul. “Lisboa, cada vez mais, será uma cidade de duas margens, com a terceira travessia do Tejo, naturalmente, mas com toda a realização do Arco Ribeirinho do Sul e, portanto, esta visão de cidade de duas margens só há uma entidade que a pode ter, que é o Porto de Lisboa”.

“Visão sinérgica”

Neste sentido, o ministro convidou o presidente da CML a juntar-se aos autarcas de todo o Arco Ribeirinho do Sul, para que, de “forma sinérgica, possam trabalhar nesta visão de uma cidade de duas margens. Queremos ampliar o espaço de contacto entre as pessoas e o Tejo, para que possam, viver de forma simbiótica com cultura, a cidade, a urbe, e aquilo que é a atividade económica”.

No entanto, o Ministro da Habitação e das Infraestruturas reforçou ainda a importância de “cuidar das infraestruturas que já existem e este é um exemplo disso”. Já Carlos Correia, presidente do Conselho de Administração da APL, destacou que “a criação do Centro Interpretativo dos Murais de Almada nas Gares Marítimas resulta de uma parceria estratégica entre a APL e a ATL.

Sensibilizar para o património histórico

Este projeto integra-se num movimento mais amplo de requalificação do património histórico edificado e do restauro de um bem cultural de grande importância”, sendo ainda “uma janela única do Porto de Lisboa e da cidade para o mundo, conectando o seu passado ao seu presente e inspirando as futuras gerações a valorizar e proteger este legado inestimável. Com este centro interpretativo, seguimos também o exemplo dos grandes portos europeus, como Roterdão, Barcelona, Hamburgo ou Génova, em que os seus centros interpretativos desempenham um papel crucial na sensibilização para a importância da conservação do património histórico, cultural e marítimo e na promoção do desenvolvimento sustentável”. ”

É nossa responsabilidade coletiva garantir que o Porto de Lisboa continue a ser fonte de prosperidade e ponto de encontro marítimo e cultural para todos”. Por outro lado, o presidente do Porto de Lisboa sublinhou ainda “a importância da parceria com a WMF, uma associação internacional que, através de agregação de fundos de filantropia, promove a recuperação e conservação de património histórico e cultural em diversos países que promovem a recuperação e conservação desse património”.

Levar a obra de Almada Negreiros a todos

Já o presidente adjunto da Associação de Turismo de Lisboa (ATL), José Luís Arnaut, destacou que “este projeto concretiza o resultado exemplar de uma parceria entre a APL, a CML e a ATL. Representa muito mais do que a abertura de um novo espaço cultural e turístico: representa a realização de um sonho de abrir as gares marítimas à população de Lisboa e aos seus turistas, e de tornar acessível, a todos, um dos maiores conjuntos de pintura mural do século XX: os murais de Almada Negreiros”.

Estes murais representam um património artístico inestimável e que estão atualmente a serem restaurados. Juntamente com a requalificação das Gares Marítimas, o espaço será, futuramente, integrado no panorama cultural e turístico da cidade de Lisboa. A requalificação das infraestruturas das Gares está a ser feita pela APL e a conclusão dos murais patentes na Gare da Rocha Conde d’Óbidos será ainda este ano. Já o início dos trabalhos na Gare Marítima de Alcântara será no início de 2025.

Diversas iniciativas

Este Centro Interpretativo pretende oferecer uma compreensão profunda do século XX em Portugal, centrando-se na importância histórica e cultural das Gares Marítimas e dos murais de Almada Negreiros.  Igualmente, vai permitir que o público explore a história das Gares Marítimas e a modernização dos serviços portuários na frente ribeirinha do Tejo. Os 14 painéis de pintura mural de Almada Negreiros, estarão em destaque nesta requalificação, onde será destacado o seu valor estético, técnico e cultural.

Este espaço não só promoverá o conhecimento artístico, mas também integrará atividades pedagógicas destinadas à população escolar, proporcionando uma abordagem educativa e cultural abrangente. O projeto conta ainda com parcerias com diversas instituições de renome, tais como a Fundação Gulbenkian, o Instituto de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova, o Museu Nacional de Arte Contemporânea, o Arquivo Municipal de Lisboa, a RTP, entre outras.

Obras do centro devem iniciar em 2025

O centro ficará na Gare Marítima de Alcântara, e estender-se-à Gare Marítima da Rocha Conde de Óbidos. Estas duas gares marítimas surgiram na época em que Duarte Pacheco foi ministro das Obras Públicas (1932 – 1936), e foram desenhadas pelo arquiteto Porfírio Pardal. Entre as décadas de 40 a 70 do século XX, foram lugares de passagem, de partida e de chegada de pessoas que vinham de todo o lado, e que chegavam a Lisboa em busca de uma vida melhor.

Segundo as familiares do pintor, Catarina e Rita Almada Negreiros, “este esforço de abrir as gares marítimas para o público tem sido trabalhada desde a altura dos nossos pais, porque estas gares deixaram de ter a importância que tinham. É uma grande alegria que nós vemos este dia chegar”. Para as netas do pintor, este espaço “é uma mais valia para toda a cidade e a nossa expectativa é que o projeto seja extraordinário e que mostre todas as áreas onde ele toca e todo o ambiente e o enquadramento histórico e político da época”.

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