MERCADOS, MUNICIPAIS! PORQUÊ?

Os Mercados Municipais enfrentam desafios que se revelam decisivos para o seu futuro, a curto prazo. Será que o desaparecimento, puro e simples, dos Mercados poria, hoje, em causa o abastecimento das populações locais (ao nível de carne, peixe, frutas e hortaliças, por exemplo)?

A encruzilhada a que chegaram os Mercados, no contexto atual do Comércio a Retalho, parece não ter segredos para as partes envolvidas, seja ao nível dos diagnósticos, seja das perspetivas de atuação futura. Só faltará mesmo (…) agir!

Por conseguinte, a presente reflexão direciona-se para outros aspetos, como o título visa ilustrar, porventura, menos focados em análises mais imediatistas. Apesar de se tratar de um tema em relação ao qual a bibliografia disponível, no nosso país, é praticamente inexistente, ainda assim, os diagnósticos e as linhas de atuação conducentes à revitalização dos Mercados, coincidem na sua generalidade.

Em relação aos diagnósticos, todos contemplam itens como sejam: variedade de produtos e qualidade associada, relação de confiança/proximidade entre comerciante e consumidor, boa relação preço/qualidade, horários de funcionamento desajustados e rígidos, acesso automóvel e estacionamento deficientes, visual pouco atrativo, logística pouco funcional, etc…

No que diz respeito às perspetivas de atuação futura e às lógicas de mudança associadas, os parâmetros focados incidem em vertentes como sejam: comercial, serviços complementares, aspetos funcionais, elementos físicos e logísticos, merchandising, informação e formação e, principalmente, administração e gestão (novas formas/modelos de gestão).

Deixando para outros fóruns essa reflexão/discussão alargada, que continua por fazer, o ponto que aqui pretendo suscitar é precisamente pôr em causa o facto de os Mercados persistirem (…) municipais.

Uma das poucas razões que vislumbro, e não subestimo a sua “importância”, para que tal denominação ainda permaneça, relacionar-se-á com a propriedade do espaço.

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De facto, são municipais, pela simples razão de que são propriedade dos Municípios.

Ainda, assim, há uma objeção a colocar, é que sendo propriedade municipal está, na maioria das situações que conheço, a ser, como tal, subaproveitada e mal gerida, uma vez que são espaços que não estão a ser rentabilizados, bem longe disso!

Importa não descurar o facto de que se trata, na esmagadora maioria dos casos, de património municipal com localização privilegiada, com áreas apreciáveis e quase sempre em áreas urbanas cuja “cotação imobiliária” não será desprezível.

Poder-se-á contra-argumentar que sendo um “serviço” que a Câmara presta, no âmbito das suas competências, o objetivo não deverá girar à volta da obtenção de lucro.

Ora, é precisamente neste ciclo vicioso que reside um dos principais problemas.

Não se rentabiliza o espaço porque os Mercados são encarados como um serviço que deve ser assegurado às populações, mas (…) ao mesmo tempo a gestão desse serviço acaba por ser, pura e simplesmente, descurada.

Daquilo que julgo conhecer da Administração local, em concreto no que se refere às Câmaras Municipais e aos Serviços que as suas estruturas contemplam, tenho para mim que, atualmente, e desde há um bom par de anos, as Câmaras Municipais têm a perceção (ainda não totalmente assumida) de que já não faz parte da sua esfera de “serviço público”, de forma efetiva, a atribuição de gestão de espaços vocacionados para o desenvolvimento de atividades comerciais.

Ou seja, todos terão consciência que a competência municipal que, grosso modo, se traduz(ia) em “(…) assegurar as condições e garantir a qualidade do abastecimento das populações locais, ao nível de bens essenciais, em especial de produtos alimentares frescos (…)”, carece de uma profunda reformulação.

Faria, com toda a certeza, sentido, no tempo em que a oferta comercial retalhista (de frescos e perecíveis) se “resumia”, praticamente, aos Mercados e ao Comércio local, no tempo em que a oferta comercial grossista se “resumia” aos Mercados Abastecedores (de carácter local), no tempo dos Matadouros Municipais, no tempo em que a Fiscalização (e “Sanidade Pecuária”) era assegurada pelas Autarquias, através dos Veterinários Municipais, no tempo em que as Cooperativas conquistaram e tiveram o seu protagonismo “comercial”, etc., etc..

Sem dúvida, outros tempos que uma História do Comércio não deverá, em caso algum, esquecer!

Não significa que as Autarquias tivessem, então, essa vocação, no entanto, tais atividades integravam o espectro das suas atribuições/competências, pelo que tinham de ser asseguradas da melhor forma que lhes fosse possível.

Parecendo um lugar-comum, o que é facto é que os Mercados Municipais enfrentam desafios que se revelam decisivos para o seu futuro, a curto prazo, podendo-se formular, para melhor ilustrar o problema, algumas questões para reflexão:

  • Será que o desaparecimento, puro e simples, dos Mercados poria, hoje, em causa o abastecimento das populações locais (ao nível de carne, peixe, frutas e hortaliças, por exemplo)?
  • Será que a perda de receitas (provenientes das “taxas” pagas pelos Comerciantes) dos Mercados Municipais teria efeitos assim tão gravosos nas contas dos Municípios?
  • Será que as Autarquias conhecem as “contas” (contabilidade analítica) de cada um dos Mercados que têm sob sua alçada?
  • Serão os Mercados, do ponto de vista do formato comercial, equipamentos sustentáveis?

A tendência evidenciada pelas respostas, que facilmente se “adivinham”, fará emergir a necessidade de agir, pelo que, face, também, ao que a experiência nos tem revelado, não se afigura que a gestão municipal seja a mais adequada, daí que a iniciativa deverá sempre partir dos próprios comerciantes e das suas estruturas associativas, dado que é aí que reside o know-how para implementar as mudanças necessárias.

As Autarquias – Câmara Municipal ou Junta de Freguesia, não terão competências específicas para gerir os Mercados, ainda que as possam ter no papel, pois jamais se poderá entender a gestão de um espaço comercial, como a simples garantia de manutenção, limpeza e segurança do espaço, em troca de uma comparticipação (“taxa”) por parte daqueles que, efetivamente detém o conhecimento, a experiência e, acima de tudo, sentem os Mercados.

Ainda que o problema não resida apenas na propriedade do espaço, o que é facto é que condiciona a iniciativa dos comerciantes e suas estruturas associativas, podendo-se, em jeito de conclusão, dizer que – Quem os tem, deles não sabe tirar proveito, e quem deles o tem de tirar não os tem!

(in “Comércio(s)! A que propósito(s)? Conversas (Im)prováveis com Fernando Pessoa”)

por João Barreta (Mestre em Gestão do Território e ex-Diretor Municipal de Atividades Económicas da CML)

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