A Assembleia Municipal de Lisboa aprovou hoje, por maioria, a proposta de descentralização de competências do Estado para a autarquia.O pacote da transferência de competências do Estado para a Câmara Municipal de Lisboa foi aceite com votos favoráveis do PS e PSD, abstenção do CDS/PP (que fica a aguardar novos «desenvolvimentos» deste processo) e contra das restantes forças.
Desta forma, a Câmara de Lisboa pode aceitar, caso o processo negocial com o Governo corra bem, um conjunto de competências referentes às vias de comunicação, justiça, bombeiros voluntários, espaços do cidadão, centros locais de apoio e integração de migrantes, habitação, património público sem utilização e estacionamento público.
A habitação, um dos itens do pacote, vai permitir a transferência de «um conjunto de bairros do IHRU e, também, de um conjunto de património disperso, que é habitacional, gerido pelo IHRU ou pelo Instituto da Segurança Social».
«Há vários fogos nestas circunstâncias», revelou João Paulo Saraiva, vereador com os pelouros das Finanças e dos Recursos Humanos, durante o debate da proposta do município em Assembleia Municipal. «Se não concordarmos com os meios associados e com os termos em que a passagem é feita, não aceitaremos», assegura João Paulo Saraiva, vereador das Finanças.Para o o PCP, PEV, BE, MPT e PAN, as contrapartidas financeiras não estão asseguradas e, esta transferência de poderes, poderá ser «um salto no escuro». Aliás, Modesto Navarro foi contundente e classificou este processo como «desastroso, sem estudos base que justifiquem as transferências propostas pelo Governo», sem se conhecer «as implicações financeiras, humanas e organizacionais de um processo desta natureza e com a ausência de conhecimento das condições efetivas dessa transferência», salientando que o atual quadro é «de enorme incerteza» e, por isso, entenderem «não estarem reunidas as condições para assumir as novas responsabilidades».
Isabel Pires, do Bloco de Esquerda, e Cláudia Madeira, do PEV, argumentaram que «esta não é uma proposta de descentralização mas sim de municipalização», afirmando que apenas contribui para a desresponsabilização do Estado em várias áreas sociais importantes, nomeadamente habitação, saúde, educação e vias rodoviárias.
Para os partidos da oposição, «é necessária uma definição clara e rigorosa dos meios financeiros e humanos a serem disponibilizados».
Mas Inês Drummond, do PS, e o vereador João Paulo Saraiva contradizem a oposição e referem que, grande parte das «novas competências que o município pretende assumir não vão representar novos encargos». É o caso da manutenção das estradas, o vereador lembra que já existe um protocolo para transferências financeiras pelas Infraestruturas de Portugal (IP).
«Em Lisboa, já está protocolado com as IP todas as vias, menos o Eixo Norte-Sul, a CRIL e a A5, no troço que está no concelho de Lisboa», recordando que os itinerários complementares e autoestradas «não vão passar para o município». Quanto às restantes estradas, as transferências vão manter-se. “Neste caso, não há nenhum processo negocial porque não há nada a negociar”, afirma.
Em relação à habitação, o vereador João Paulo adianta que o processo negocial com IHRU e Segurança Social está em aberto, salientando que existe uma comissão de análise, com elementos das duas partes, para – num prazo de seis meses – elaborar um relatório que discrimina os custos e proveitos associado ao imobiliário, grande parte dele resultante de operações de realojamento em Lisboa. Depois, há mais três meses para apreciar o documento e, só depois, a autarquia tomará uma decisão, com a aprovação em Assembleia Municipal.
O vereador é claro ao garantir: «Se não concordarmos com os meios associados e com os termos em que a passagem é feita, não aceitaremos».
Ainda no setor imobiliário, outro dos maiores encargos estimados reside na aceitação de património devoluto do Estado para recuperação e disponibilização em mercado ou para equipamentos.
«Abre-nos um caminho possível para utilização de imóveis do Estado para habitação, para um conjunto de equipamentos. Muitas vezes é muito difícil encontrar o espaço necessário numa cidade consolidada e histórica como a nossa. Vai abrir a possibilidade de resolver alguns dos maiores problemas que o município tem para resolver”, defendeu o vereador.Um outro aspeto contemplado por este pacote de transferência, refere-se ao atendimento ao cidadão, com a passagem de duas Lojas do Cidadão (Laranjeiras e Chelas) para a gestão da autarquia. Uma terceira, em construção no Mercado 31 de Janeiro, é já fruto de um protocolo entre Lisboa e a Agência de Modernização Administrativa.
A Câmara Municipal de Lisboa, pela voz do vereador João Paulo Saraiva, garante que nas restantes competências que agora se propõe aceitar não estão previstos encargos significativos. A gestão das praias, primeiro, porque estas são inexistentes, e autorização de modalidades afins do jogo porque estas representarão apenas 150 processos administrativos por ano, ao cuidado de dois funcionários.
Na justiça, também, as competências em causa já são hoje assumidas por Lisboa (comissões de proteção de menores, reinserção social e acompanhamento da violência doméstica), ocorrendo o mesmo com o apoio às associações de bombeiros voluntários.
Relativamente ao estacionamento, a autarquia considera que vai representar receitas adicionais. Nas infrações leves, o município vai poder receber 100% do resultado de coimas, e nas graves ficará com 70% e não 30%, como sucedia anteriormente.
Está previsto que atual processo de transferência de competências se conclua até 1 de janeiro de 2021. Um grande número de autarquias tem vindo a rejeitar a passagem de tarefas. Até ao momento, apenas 35 municípios aceitaram ficar com as competências do Estado.